Diocese de Guarulhos

SÃO PAULO - BRASIL

“O Senhor fez em mim maravilhas.” (Lc 1,49)

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Maria, mulher da escuta, cristã sinodal!

Neste breve artigo, iremos refletir e meditar sobre alguns aspectos da colaboração de Maria, Mãe de Deus e Mãe da Igreja, na história da Salvação, na vida e na missão da Igreja.

O Papa Francisco, convida a Igreja para uma atitude de escuta. O Sínodo dos Bispos sobre a Sinodalidade tem sido preparado a partir da escuta de diversos grupos. O pontífice propôs escutar as pessoas que estão inseridas na comunidade e as que estão afastadas, as pessoas sofredoras, sem teto, sem-terra e sem trabalho, desesperançadas.

O compromisso de cada pessoa batizada, é escutar a Palavra de Deus, deixar ser tocado por ela; ser testemunha de Cristo, na Igreja e na sociedade; e corresponder firmemente às exigências evangélicas de amar a Deus e ao próximo como a si mesmo; acolher e cuidar das pessoas caídas à beira do caminho (cf. Lc 10,25-37), promover e cuidar da vida de todo o planeta, criação de Deus.

A Igreja nascente, atenta, ao testemunho da Mãe de Jesus, transmitiu de geração em geração o apreço ao discipulado de Maria, a Bem-Aventurada!

Maria sempre foi uma cristã sinodal, ela participa da verdadeira festa de comunhão e se coloca a serviço da Igreja nascente, no sentido de que caminha junto com seu Povo, desde Pentecostes até a consumação da história da nossa salvação.

As mulheres presentes na comunidade participam do dinamismo suscitado pelo Espírito Santo de Deus. Maria, mãe de Jesus e as outras mulheres, presentes na comunidade de fé, são também elas, anunciadoras da boa notícia de Jesus a partir da própria comunidade de fé, junto com os outros discípulos

Importante mencionar que, Maria é aquela que, juntamente com o Espírito Santo, sempre está no meio do povo (EG, 284). “Ela reunia os discípulos para O invocarem (At 1, 14), e assim tornou possível a explosão missionária que se deu no Pentecostes. Ela é a Mãe da Igreja evangelizadora e, sem Ela, não podemos compreender (…) o espírito da nova evangelização”. Por isso, suplicamos:

Maria, te pedimos que nos ajude no compromisso com a nossa fé cristã, a partir da vivência na pequena comunidade.

 

Maria é modelo de escuta. Ela recebe a visita do anjo, e fica atenta, na escuta ao que Deus espera dela, e da sua colaboração ao Seu Projeto. Ela faz uma escuta ativa. Escuta, e deixa o Espírito falar no seu coração, para que agraciada pelo Espírito de Deus, manifeste seu Sim como adesão ao Projeto de Deus na sua vida e na vida do seu povo.

Nossas comunidades eclesiais, todo o povo de Deus, são chamadas a uma conversão pastoral e missionária. Que possamos oferecer a nossa vida e a nossa participação na caminhada de fé, em comunhão com toda a Igreja. Supliquemos confiantes:

Maria ensina-nos a fazer o que o disse o Mestre Jesus (cf. Jo 2,5).

 

No Magnificat, Maria exalta seu Deus “porque olhou para a humilhação da sua serva”, “socorreu seu servo Israel, lembrando-se da sua misericórdia(…)” (cf. Lc 1, 48. 54). A misericórdia de Deus “se estende sobre aqueles que o temem” (cf. Lc 1,50). Louvava a Deus porque “derrubou os poderosos de seus tronos” e “aos ricos despediu de mãos vazias” (Lc 1, 52.53), é mesma que conservava cuidadosamente “todas estas coisas ponderando-as no seu coração” (Lc 2, 19). Ela é a serva humilde do Pai, que transborda de alegria no louvor (cf. EG, 286). Na sua fé e escuta ativa, Maria sai às pressas ao encontro de Isabel, que era de idade avançada e estava grávida (cf. Lc, 1, 39 ss). Supliquemos com confiança:

Maria ensina-nos a escutar a Palavra de Deus, e ter a disponibilidade para responder, ativamente, ao que Deus nos chama.

 

Para o papa Francisco “ Maria é como “a amiga sempre solícita para que não falte o vinho na nossa vida.”  Como “aquela que tem o coração trespassado pela espada, que compreende todas as penas. Como Mãe de todos, é sinal de esperança para os povos que sofrem as dores do parto até que germine a justiça. Ela é a missionária que se aproxima de nós, para nos acompanhar ao longo da vida, abrindo os corações à fé com o seu afeto materno. Como uma verdadeira mãe, caminha conosco, luta conosco e aproxima-nos incessantemente do amor de Deus” (EG, 286).

Como Igreja peregrina neste mundo, cada cristã e cristão é chamado a viver o Batismo, na Igreja e na sociedade, como “sal da terra e luz do mundo” (cf. Mt 5,13). Sujeitos eclesiais. Disponíveis para acolher a Palavra de Deus e na liberdade de filhos e filhas de Deus, participar da festa da comunhão, na pequena comunidade, e como Igreja em saída, semear a paz, a justiça, a fraternidade, a amizade social.

Peçamos com confiança: Maria, Mãe de Deus e da Igreja, acompanhe a peregrinação sinodal do povo de Deus, indicando a meta da profecia, e o estilo mariano da força revolucionária e do afeto.

Que o Espírito Santo de Deus desperte cada pessoa batizada para assumir a vocação cristã, com alegria, no dinamismo da Trindade Santa. Que sejamos construtores de Paz! Que nossa comunicação esteja a serviço da vida! Que o Senhor Deus, misericordioso, ilumine nossas ações no campo da evangelização e de ações sociotransformadoras, para que em Jesus, todos os povos tenham vida.

Que o Magnificat (cf. Lc 1,46-55), louvor que exprime a espiritualidade de Maria, nos inspire a fazer da nossa vida, toda ela um Magnificat, como ato de agradecimento pela misericórdia de Deus, ao reconhecer como Maria, a misericórdia de Deus para com Seus filhos e filhas.

Maria, cheia da presença de Cristo, que saibamos pedir a “santa ousadia de buscar novos caminhos para que chegue a ‘todos, todos, todos’ a beleza que não se apaga, fazendo-nos alcançar um novo ardor de ressuscitados para levar a todos o Evangelho da vida que vence a morte” (cf. EG, 288), em uma Igreja sinodal, em permanente estado de missão, acolhedora, samaritana e serviçal.

 

Celia Soares de Sousa

Cristã leiga, teóloga

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O sonho é viver num jardim, mas há violência entre irmãos

São inúmeros os textos bíblicos que justificam e esclarecem o tema da Campanha da Fraternidade desde ano: Fraternidade e Amizade Social. O lema: Somos todos irmãos foi escolhido das páginas do evangelho de Mateus, 23,8. No contexto, Jesus procura explicar aos discípulos que seu projeto é servir. Esclarece que entre os discípulos, só Deus deve ser chamado de mestre, eis o motivo que nos tratarmos e vivermos como irmãos e irmãs.

O caso de Caim e Abel é um episódio esclarecedor, quando se está em debate o projeto de vivermos como irmãs e irmãos, como deseja o próprio Deus, para toda a humanidade. Depois de ser expulso do paraíso criado por Deus, o homem se encontra diante do fenômeno da morte. Nos meandros desse fratricídio bíblico esconde-se um jogo de interesses entre grupos rivais. Pastores e agricultores se digladiam na saga pelo poder.

A narrativa bíblica não esconde que, uma vez fora dos desígnios de Deus, o ser humano é capaz de derramar o sangue do próprio irmão sobre a terra por ele cultivada (v.8) e, após o assassinato, desprezar a pergunta do Criador: “onde está teu irmão?” (v. 9).

O projeto de Deus do ser humano viver no Jardim e na mais bela sintonia com a natureza, com os animais e com os seres humanos, é desprezado. Da prática do bem, para o conhecimento do bem e do mal; da vivência do amor, para o reinado da “ira” (v. 5). A violência chega ao ponto do ser humano não se sentir responsável nem mesmo pela vida do próprio irmão. “Por acaso sou eu o guardo do meu irmão” (v. 10).

            Há três genealogias presentes no texto. Essa forma literária foi composta em torno dos personagens: Caim e Abel (Gn 4,1-16), a descendência de Caim (Gn 4,17-24) e a terceira genealogia, indicando a substituição do irmão Abel assassinado garantida a Set (Gn 4,25-26). Na apresentação das genealogias, visualizamos no texto a seguinte forma:

  • Gn 4,1-2: vemos a primeira genealogia apresentando os irmão Caim e Abel. O primeiro trabalha como “cultivador do solo” e o segundo, “pastor de ovelhas”.
  • Gn 4,17: nesta genealogia, Caim é visto na base das cinco gerações e inserido na origem das cidades, onde atuam as mais diferentes profissões: construtores de cidades, artesãos de tendas, pastores, tocadores de lira, charamela e laminadores em cobre e ferro (vv. 17,20-22).
  • Gn 4,25: trata-se da genealogia apresentada em substituição a Abel. Desta geração, após o nascimento de Set, aparecerá a origem da invocação do nome do Senhor. “O primeiro a invocar o nome do Senhor” (v. 26).

Caim surge como personagem principal. Seu nome, citado 13 vezes  na narrativa, liga-se ao clã dos Quenitas. Um clã que, embora não tenha  ligação direta com as doze tribos de Israel, será, por sua vez, portador e  defensor do nome do Senhor (Js 15,57). Por outro lado, Abel, liga-se ao “sopro, fumaça”, algo sem muito valor.

No confronto entre os “irmãos”, acompanhamos o conflito entre os agricultores da terra e os pastores. A busca da superação deste conflito irá determinar a quem pertencerá o campo, as terras que oferecem a base de alimentação e o poder

O texto não esconde essa consciência de Caim frente a sentença recebida da parte do Senhor e ressalta a fragilidade de sua conduta e de uma cultura baseada na violência. Sem asilo nem proteção, sua vida está em perigo (v. 14). Mas Deus é fiel ao seu projeto. Não criou o homem para que este reproduza o sistema de violência. Semelhante a Gn 3,21, ele vem em auxílio à sua criatura, abrandando sua pena e colocando em Caim “um sinal’ (v. 15). Tal sinal, conhecido como tatuagem, identificará Caim como participante de um clã, em que a morte de sangue é vingada sete vezes.

 

Pe. Antonio C. Frizzo

acfrizzo@uol.com.br

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Amizade social é tema da Campanha da Fraternidade

Inspirada nas teses do papa Francisco, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) lançou na quarta-feira de cinzas – início da quaresma para os cristãos católicas -, a edição de número 60 da Campanha da Fraternidade. A ideia central da Campanha é divulgar a proposta de Amizade Social, firmada pelo papa Francisco, na encíclica Fratelli Tutti, lançada em outubro de 2020.

Amizade Social tem como sinônimo o gesto de cuidar. A preocupação de cuidar está presente em todas as dimensões de nossas vidas. Das mais insignificantes e rotineiras atitudes às significativas opções que direcionam nossas vidas, as vidas no mundo. Nas relações pessoais – família, trabalho, lazer, amores – o gesto de cuidar, querer bem, estar bem é algo intrínseco no ato humano. Temos uma atenção particular de cuidar dos nossos grupos de amigos. Estamos, constantemente, rodeados de pessoas. Cada qual de nós se encontra naturalmente ligado a um grupo social. Somos indivíduos, mas ao mesmo tempo um ser social e, como tal, temos que cuidar da nossa individualidade e do grupo que nos acolhe. Afinal, somos humanos e, como tal, um ser social envolvido numa complicada teia de relacionamentos que identificamos como sociedade. Sabemos, por experiências, que ninguém vive só. Somos pessoas e aprender a ser pessoa, ser grupo e ser povo torna-se um desafio.

Tal aceno à prática do cuidar não impede inúmeros gestos e projetos marcados pelo descuidar. Fala-se muito da “divisão de narrativas” que nos envolve. Não é difícil encontrar alguém que não tenha se retirado do grupo do whatsapp ou das redes digitais, após amargar gestos, ideias e palavras repletas de intolerâncias, racismos, xenofobias e agressões verbais. Há uma crise que perpassa nossas relações humanas. Então, o cuidar tornou-se um desafio.

No atual sistema econômico tudo vira mercadoria. Nessa linha de pensar não exista o humano, pois o ser humano é visto como algo que também  tem um preço. Tudo que vemos e tocamos vira mercadoria com preço e data de validade. As vidas de inocentes importam? Não há pessoas, não há “fidelidade nos relacionamentos e projetos humanos que não sedam ao convite insano do dinheiro”. “A vida é grana” como cantou Cazuza.

Uma fraternidade marcada pela Amizade Social procurará conviver com os diferentes. Buscará dialogar com comportamentos, ideias diferentes daquelas que marcam meu convívio social. Não somos inimigos. Falas ou comportamentos marcados por bullying, feminicídio, machismo, pedofilia, racismo, pena de morte, intolerância religiosa, desrespeito com a democracia, hiper individualismo, aversão aos pobres e destruição do meio ambiente em nada colaboração para uma boa e salutar convivência social (CF 34-52).

Cuidar tem, para o universo cristão, um senso de projeto de vida. Cuidar do próprio corpo, cuidar do corpo dos outros, cuidar dos pobres e dispensar um bom tempo para cuidar do planeta Terra são gestos, projetos de preservar a vida. Garantir às futuras gerações os dons doados pelo Criador (Gn 1-11). Cuidar, tal como Noé, o cultivador, logo após o dilúvio (Gn 9,20) que se mostrou atento aos mais frágeis. Cuidar como o bom pastor identificado por seu ato de zelar pelas ovelhas extraviadas, machucadas, feridas e abatidas (Ez 34,1-16; Jo 10,1-18). Eis o alerta proposto pelo Papa Francisco: cuidar das feridas da nossa gente. Cuidar daquele, daquela que tem a vida ameaçada.

Antonio C. Frizzo

Acfrizzo@uol.com.br

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A esperança na vida eterna e o amor que nos mantêm unidos.

No Antigo Testamento, livro de 2 Mac 12, 38-45, já existe a ideia de que podemos e devemos interceder por aqueles que já partiram para a eternidade. Esse entendimento foi abraçado pelo cristianismo católico, e encontra em cada um de nós um refrigério para continuarmos a interceder por aqueles que não estão mais em nosso convívio aqui na terra. Acreditamos que haja uma conexão direta entre a Igreja Triunfante (os que estão na glória), com a Igreja Militante (nós que estamos militando neste mundo) e, com a Igreja Padecente (aqueles que estão se purificando para entrar na vida eterna).

A dor experimentada por todos que já perderam pessoas queridas, é marcada profundamente e deixa uma sensação de impotência diante da morte, que estabelece uma separação física. Muitos experimentam um vazio tão grande com suas perdas, que chegam a ter sua saúde mental afetada, e que necessitam de ajuda de especialistas para enfrentar os problemas causados pelo luto.

Embora as questões sobre a vida após a morte seja um mistério, podemos sim nos empenhar a conhecer quais os textos bíblicos nos dão ensinamentos sobre o tema e, buscar a luz de esclarecedores estudiosos sobre o tema, um correto entendimento. Nós, católicos, necessitamos conhecer aquilo que o magistério da Igreja trás de estudos e documentos, para assim formarmos um entendimento com uma base sólida. Dentro desta perspectiva, a Carta Encíclica Spe Salvi – “é na esperança que fomos salvos”, de Bento XVI, trata sobre a fé e a esperança, pontuando vários aspectos relacionados com a vida eterna.

A Encíclica Spe Salvi, aborda a esperança cristã em vários tópicos ou temas que podemos sintetizar como: Articulação entre fé e esperança; Dilatar a esperança; A vida eterna como objeto da esperança; A natureza da esperança cristã; Lugares de experiência da esperança; Nova perspectiva para a compreensão das realidades escatológica. Nesta reflexão fixarei o olhar sobre o (n.48) da Encíclica que menciona sobre a prática de que se possa ajudar, através da oração, os defuntos no seu estado intermédio adotada no antigo judaísmo, e que foi adaptada pelos cristãos com grande naturalidade, é comum à Igreja oriental e ocidental. Existe a compreensão de que para as almas dos defuntos, pode ser dado alívio e refrigério, mediante a Eucaristia, a oração e a esmola. Porém, o texto que salta o olhar é apresentado por Bento XVI, como:

 

            “O fato de que o amor possa chegar até ao além, que seja possível um mútuo dar e receber, permanecendo ligados uns aos outros por vínculos de afeto para além das fronteiras da morte, constituiu uma convicção fundamental do cristianismo através de todos os séculos e ainda hoje permanece uma experiência reconfortante. Quem não sentiria a necessidade de fazer chegar aos seus entes queridos, que já partiram para o além, um sinal de bondade, de gratidão ou mesmo de pedido de perdão? Aqui levantar-se-ia uma nova questão: se o « purgatório » consiste simplesmente em ser purificados pelo fogo no encontro com o Senhor, Juiz e Salvador, como pode então intervir uma terceira pessoa ainda que particularmente ligada à outra? Ao fazermos esta pergunta, deveremos dar-nos conta de que nenhum homem é uma mônada fechada em si mesma. As nossas vidas estão em profunda comunhão entre si; através de numerosas interações, estão concatenadas uma com a outra. Ninguém vive só. Ninguém peca sozinho. Ninguém se salva sozinho. Continuamente entra na minha existência a vida dos outros: naquilo que penso, digo, faço e realizo. E, vice-versa, a minha vida entra na dos outros: tanto para o mal como para o bem. Deste modo, a minha intercessão pelo outro não é de forma alguma uma coisa que lhe é estranha, uma coisa exterior, nem mesmo após a morte. Na trama do ser, o meu agradecimento a ele, a minha oração por ele pode significar uma pequena etapa da sua purificação. E, para isso, não é preciso converter o tempo terreno no tempo de Deus: na comunhão das almas fica superado o simples tempo terreno. Nunca é tarde demais para tocar o coração do outro, nem é jamais inútil”.

 

Talvez nossa prática de oração já fosse normal em relação aos falecidos, mas ao ter contato com esses ensinamentos do magistério da Igreja, minha esperança foi renovada e fui inflamado de uma alegria transbordante, pois vejo o quanto podemos beneficiar com nossas intercessões, aqueles que se foram e, quanto o amor que nos une pode estar em comunhão entre si. Nossas orações constituem uma expressão de amor por todos que tanto amamos em vida e, que nem a morte pode impedir que continuemos amando. Como nos afirmou o Papa Francisco em outro contexto da “Laudato si”, “Tudo está interligado”. Podemos fazer um paralelo com os textos da Encíclica Spe Salvi, dizendo que nossas vidas estão sim interligadas com as novas dimensões daqueles que já partiram.

É na esperança que fomos salvos (Rm 8,24).

Celso Rogério San-Tana TeixeiraAluno do 5º Ano de Teologia pela PUC-SP e aspirante ao Diaconato Permanente pela Diocese de Guarulhos

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Como entender a palavra de Deus com uma base sólida da fé católica, relacionando as fontes da teologia para uma boa argumentação?

Para falarmos das três fontes (Sagrada Escritura, Tradição e Magistério) é necessário esclarecer que abordaremos o tema numa visão da Teologia Católica, pois embora a Teologia Protestante, em algumas denominações tenham além da Sagrada Escritura, também como fonte a Tradição, eles não possuem como fonte o Magistério.

Tendo como fonte primária a Sagrada Escritura, que é a Palavra de Deus enquanto redigida sob inspiração do Espírito Santo, ela é base para toda reflexão em primeiro lugar, pois tanto o Antigo Testamento, como o Novo Testamento formam o conjunto de escritos que instruem o Povo de Deus. O próprio Jesus Cristo, em que toda revelação do Deus altíssimo atinge a sua plenitude, ordenou aos apóstolos que o Evangelho, fosse pregado como fonte de toda verdade salvadora e da disciplina dos costumes, comunicando os seus dons divinos, conforme a Constituição Dogmática Dei Verbum nº 418.

A Tradição que vem dos apóstolos e transmite o que estes receberam do ensinamento e do exemplo de Jesus, e o que receberam por meio do Espírito Santo. A transmissão da Boa Nova no início do cristianismo, por não possuírem ainda o Novo Testamento escrito, tiveram que usar a transmissão oral, que atesta a Tradição viva. A Tradição recebe expressões adaptadas aos diversos lugares e às diversas épocas, cabendo ao Magistério da Igreja, sua manutenção, modificação ou abandono, conforme o Catecismo da Igreja Católica menciona no nº 83. A Sagrada Escritura e a Sagrada Tradição devem ser aceitas e respeitadas com igual reverência.

O Magistério da Igreja, formado pelos bispos (sucessores dos apóstolos), em comunhão com o sucessor de Pedro, o bispo de Roma, tem o ofício de interpretar autenticamente a Palavra de Deus, escrita ou transmitida, mas compreendendo que o Magistério não está acima da Palavra de Deus, mas a seu serviço. Recebendo dos próprios apóstolos o múnus magisterial, os bispos ensinam apenas aquilo que lhes foi transmitido, ao mesmo tempo que por mandato divino e com o auxílio do Espírito Santo, devotamente a escuta, santamente a guarda e fielmente a expõe, absorvendo tudo aquilo que propõe que se deva crer como divinamente revelado deste único depósito da fé, conforme relata a Constituição Dogmática Dei Verbum nº 426.

As três fontes, portanto, encontram-se fortemente unidas e associadas, formando uma base sólida para toda reflexão Teológica que busca uma argumentação fundamentada e, não a reduzindo a uma interpretação pessoal ou apartada daquilo que a transmissão da Tradição efetivamente nos deixou.

 

Celso Rogério Santana Teixeira – Aluno do 5º Ano de Teologia pela PUC-SP

Aspirante ao Diaconato Permanente pela Diocese de Guarulhos

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O Profetismo em Israel (Reino do Norte)

Temos como primeiros representantes do Profetismo em Israel Elias e Eliseu, sempre em oposição ao rei Acab e à rainha Jesabel, por causa da defesa da Lei (Aliança) e da vida do povo que os soberanos menosprezavam; eles promovem uma verdadeira denúncia dos abusos do poder do rei  e a idolatria promovida por Jesabel. Consequência disso foram as perseguições que Elias sofreu (ver 1Rs 18,3; 19, 10; Jr 18, 18; 26,11)

 

Os PROFETAS, fiéis à Aliança não podiam ser coniventes em relação aos atos do rei. Este era um discernimento difícil, devido aos riscos que os profetas corriam.

 

O CICLO DE ELIAS (veja os Textos: 1Rs 17 – 19; 21; 2Rs 1, 1 – 2, 18).

ELIAS foi o maior representante do profetismo e figura-síntese do profetismo do Antigo Testamento (veja Lc 9, 30 = Mt 17, 4 = Mc 9,4).

Natural de Tesb (Galaad), distanciado do poder político (rei) num nível bem profundo.

Seu lugar é o deserto, refúgio diante das perseguições. Defensor dos pobres e crítico da ganância e do abuso do poder dos ricos e reis, estabelece uma convivência com os pobres: a viúva de Sarepta, em Sidônia (1Rs 17, 7 – 24). Sofreu a feroz perseguição ao ponto de se considerar “o único que sobrou” (1Rs 18 e 19).

Era um “homem de Deus” que trazia a experiência do Deus Libertador, a fé que brota da partilha e a esperança (nuvem) diante da seca. Expressou certa indignação contra a ambição sem medida do rei Acab (1Rs 21).

Traz uma singular experiência de Deus: a “brisa suave” (1Rs 19, 9 – 14); arrebatado aos céus num “carro de fogo” (2Rs 2, 11 – 12). Malaquias anunciou a “volta de Elias” (Ml 3, 23 – 24) e Jesus ofereceu nova interpretação da “volta de Elias” (Mt 17, 9 – 13), tamanha a importância do profeta Elias.

 

O CICLO DE ELISEU:

Foi “Herdeiro” da profecia e do “espírito de Elias” (2Rs 2, 13s). Foi um profeta mais popular (2Rs 2 – 13), chamado por Elias (1Rs 19, 19 – 21). Em sua história, há “causos”: narrativas com tons exagerados, com milagres e ações “esquisitas”. Ex.: “milagres aquáticos” (2Rs 2, 14; 2, 21; 5, 10; 6, 6) e “histórias de cunho popular” (2Rs 2, 23 – 24; 4, 1 – 7; 4, 9 – 44; 13, 21).

Temos que tomar cuidado com o gosto pelo “extraordinário”, pois a mensagem mais profunda do profeta é mais importante.

A ação profética de Eliseu é fundamental no contexto político em que viveu (Eclo 48, 13): veja os envolvimentos do profeta em eventos políticos: 2Rs 3, 4 – 27; 6, 8 – 23; 8, 7 – 15; 6, 24 – 7, 2; 9, 1 – 10 e 13, 14 -20.

Padre Éder Aparecido Monteiro

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Profetas: Começo e evolução do profetismo

A palavra “profeta” (NABI, em hebraico) hoje tem muitos sentidos. Muitos caracterizam os prfetas como previsores de futuro (precognitivos, videntes, como em 1Sm 9, 9). Podemos encontra-los em grupos de “homens em transe” (1Sm 10, 5s; 19, 24; 10, 10; Dt 13, 2 – 4; 1Rs 17, 17s; 2Rs 2, 19 – 22; Nm 22, 2 – 6), como intérpretes de sonhos (Cf Dt 13, 2 – 4) ou simples consultores de Deus (1Sm 8, 6 – 7). Às vezes, eles aparecem como conselheiros de reis (conf. Khalil Gibran), integrados a uma corte, como os prpfetas Natã e Isaías (veja 1Sm 10, 1.24; 16, 12 -13; 2Sm 7, 1 – 7; 24, 11 – 19; 1Rs 1, 34; 11, 29 – 31; 22, 5).

No profetismo clássico da Bíblia, eles aparecem como defensores dos pobres e ferrenhos críticos dos desmandos dos monarcas e são reconhecidos como “homens de Deus”, homens da fé em Deus. Sua fé se fundamenta no Deus libertador do Êxodo (go’el). Alguns profetas formarão grupos proféticos com o objetivo de manter vigilância crítica sobre os abusos dos reis. Durante o Exílio na Babilônia (ver Is 40 – 55 e Ez) serão os consoladores do povo sofrido.

 

O MOVIMENTO PROFÉTICO:

O profetismo também esteve presente em outros povos do Oriente Antigo (Egito, Mesopotâmia, Pérsia, etc). Nos textos proféticos da nossa Bíblia encontramos afinidade entre os escritos de Mari (Mesopotâmia) e profetas de Israel: o profeta era um ser humano que recebia uma missão nos momentos de crise.

A diferença consiste em que os profetas de outros povos se constituíam mensageiros de deuses e os profetas de Israel se dirigiam ao povo e aos reis exigindo conversão interior e exterior, anunciavam a Palavra de Deus e denunciavam as injustiças, arriscando suas vidas. Certos anúncios dos profetas eram feitos com ações simbólicas.

         Temos duas fases do profetismo em Israel no tocante à sua relação com os reis (monarquia):

1º fase: apoio à monarquia (ver 1 Sm 22, 5; 2 Sm 24, 11-19).

2º fase: crítica e combate à monarquia (ver 1Rs 19, 10.14) = fase da independência do Profetismo.

 

SEPARAÇÃO ENTRE PROFETISMO E MONARQUIA

O Deus anunciado pelos profetas era o Deus da Aliança (Iahweh), um Deus que legitimava tudo o que os reis faziam.

Os profetas de Israel estavam a serviço da Aliança entre Deus e o povo. Por isso, era preciso estabelecer uma certa independência ou até oposição aos atos dos reis (Elias, Jeremias, Amós, Oséias, Miquéias, etc). E, quando falam em nome de Deus contra os desmandos dos reis, encontram dificuldades para a missão (perseguições, por exemplo).

 

OS PRIMEIROS PROFETAS:

Samuel: foi um opositor da monarquia (1Sm 8), mas acabou ungindo Saul e Davi como reis de Israel (1Sm 10; 15, 10 – 23) por ordem de Deus.

Natã: sempre presente na corte de Davi (2Sm 7, 2; 12 e 1Rs 1); favorável à dinastia davídica, mas crítico diante dos pecados do rei Davi.

Gad: chamado “vidente”, era mais severo (ver 2Sm 24, 11 – 14. 18 – 19; 1Cr 21, 9 – 13 . 29; 29, 9; 1Sm 22, 5).

Natã e Gad: conselheiros severos do rei Davi (2Sm 7; 12; 24).

 

Já no tempo do rei Saul, os profetas reagem contra os erros dos reis, que prejudicavam o povo (ex.: Samuel). Alguns eram até próximos dos palácios, mas não eram coniventes com tudo o que os reis faziam!

        Após o Cisma de 931 a.C., quanto aos profetas do Norte (Israel), o profetismo floresceu em fidelidade às tradições javistas do tribalismo; os profetas eram “mais conservadores” e exerciam severas intervenções como “homens de Deus”, criando uma distância cada vez maior entre eles e o palácio dos reis e dos templos oficiais do culto nacional (ex.: Elias, Eliseu e Amós).

Já no Reino do Sul (Judá), o profetismo será um pouco mais tardio e estará condicionado às promessas messiânicas a partir de Davi ou da dinastia davídica (Natã e Isaías), mas sempre voltado para a fidelidade à Aliança com Deus (Jeremias, Sofonias, Miqueias, por exemplo).

Padre Éder Aparecido Monteiro

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O Reino do Sul (Judá) 1ª Parte

– Tribo de Judá: aparente tranquilidade; manteve-se fiel à dinastia Davídica (2Sm 7, 8 – 16; Sl 89, 4)

– Templo de Jerusalém: único lugar “autorizado” pelo Senhor para o culto, conf. Dt 12, 4 – 11);

– Jerusalém; Capital escolhida por Deus para habitar (1Rs 11, 36; 14, 21; Sl 48);

– Salmos: falam da Monarquia e da cidade e de uma liturgia a serviço do poder;

– Reis: avaliação negativa =” fizeram o que é mal aos olhos do Senhor”, exceto Ezequias e Josias;

– alguns reis marcaram muito a história do Reino de Judá.

 

ROBOÃO, de 931 – 913 a.C. (ver 1Rs 14, 21 – 31 e 2Cr 10 – 12)

  • problemas econômicos e políticos internos ausentes;
  • problemas com países vizinhos:

– Egito: o faraó Sesac atacou e saqueou Jerusalém (1Rs 14, 25 – 28 ; 2Cr 12, 2.9 – 11)

–  Reino do Norte: Roboão, em guerra contra Jeroboão I, tentou em vão recuperar territórios perdidos para o Reino do Norte (ver 1Rs 14, 30; 2Cr 12, 15b); as rixas continuaram no tempo de Abiam (913 – 911 aEC) e de Asa (911 – 870 aEC).

 

OZIAS/AZARIAS, de 781 – 740 a.C. (ver 2Rs 15, 1 – 7; 2Cr 27, 1 – 9)

  • enfraquecimento do Egito;
  • restabelecimento do poder político ao Sul de Judá.

 

ACAZ, de 736 – 716 a.C. (ver 1Rs 16, 1 – 20; 2Cr 28, 1 – 27)

  • Assíria: seu poder se firmou na região;
  • dúvida: unir-se à Assíria ou ao Egito – pressões;
  • conflito com Israel e Damasco (Aram/Síria), que queriam uma coalizão contra a Assíria;
  • Isaías (profeta) aconselhou a neutralidade em relação à coalizão e recomendou confiança no Senhor;
  • Israel e Damasco atacaram Judá;
  • Acaz fez um acordo com a Assíria e tornou-se seu vassalo;
  • Isaías e Miquéias (profetas) viram nesse acordo do rei Acaz com a Assíria uma violação à Aliança com Deus;
  • Assíria: derrotou Israel e Damasco e tomou grande parte do território de Judá (Is 1, 7 – 8; 2Rs 18, 13 – 16).

 

EZEQUIAS: de 716 – 687 a.C. – ver 2Rs 18, 1 – 20; 2Cr 29, 3 – 32, 33

  • promoveu uma ampla reforma religiosa em todo o Reino de Judá (ver 2Rs 18, 4 e 2Cr 29, 3 – 32, 33);

– purificação do Templo;

     – celebração da expiação pelos pecados;

     – restabeleceu o culto legítimo, conforme a Aliança;

     – convocou a solene celebração da Páscoa;

     – reformou o sacerdócio em Judá.

  • mereceu do Senhor um milagre de cura, apoado por Isaías, o profeta (2Rs 20, 1 – 11);
  • enfrentou o cerco da Assíria em 701 a.C. (2Rs 19, 20 – 34);
  • libertação: não trouxe a conversão proposta por Isaías;
  • o povo achava que a Monarquia e o Templo garantiriam por si mesmos sua sorte (Is 22, 1 – 4);
  • a Assíria começou a declinar e surge um outro Império: a Babilônia;
  • uma embaixada babilônica visita Ezequias: Isaías viu nesse fato um presságio do futuro Exílio de Judá (2Rs 20, 12 – 19).

 

MANASSÉS: de 687 – 642 a.C. – ver 2Rs 21, 1 – 18; e 2Cr 33, 1 – 20

  • período difícil: foi um rei cruel e ímpio;
  • foi abolida a reforma religiosa de Ezequias;
  • violência e opressão pesada sobre o povo (2Rs 21, 16);
  • ausência de grandes profetas, mas alguns advertiram o povo (2Rs 21, 10 – 15);
  • adoção de sacrifícios humanos (2Rs 21, 6).

 

AMON: 642 – 640 aEC – ver 2Rs 21, 19 – 26; 2Cr 33, 21 – 25

  • fez o mesmo que seu pai: idolatria, violência, opressão;
  • seus próprios servos o mataram: 2Rs 21, 23;
  • “povo da terra” (=líderes do povo): queriam mudanças e defendiam a fidelidade à monarquia davídica (2Rs 11, 20; 14, 21; 21, 24);
  • eliminação dos rebeldes pelo “povo da terra”;

 

Padre Éder Aparecido Monteiro

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O Reino do Norte – Israel

Foram cinco dinastias diferentes que reinaram: dezenove reis; sete foram assassinados e um se suicidou; foram duzentos e nove anos de rebeliões contra Deus (Aliança) e houve o crescimento da violência, injustiça, suborno, luxo, ao lado do empobrecimento de muitos.

Quanto aos Escritos sobre o Reino do Norte, surgiram relatos bem posteriores aos fatos narrados, com interpretações bem determinadas (1Rs 12, 1 – 2 Rs 17).

REIS QUE IMPRIMIRAM SUAS MARCAS PROFUNDAS NO REINO DO NORTE (ISRAEL):

JEROBOÃO I – ver 1Rs 14 (931 – 910 a.C.)

Morou em Tersa (1ª. Capital do Reino do Norte; liderou uma revolta contra o rei Salomão; foi chamado a ser rei pelo profeta Aías de Silo (1Rs 11, 29 s); construiu santuários em Betel e em Dã, colocando neles o bezerro de ouro (uma representação divina); durante seu reinado, o profeta Aías se distanciou do rei (1Rs 14, 1s) porque este favoreceu a idolatria no reino, como forma de manipulação e exploração política. Deixou seu filho Nadab no trono, porém, após dois anos, Baasa assassinou Nadab e tomou o trono de Israel.

AMRI – ver 1Rs 16, 21 – 28 (885 – 874 a.C.)

Em 885 a.C. – começou seu reinado em Tersa. Em 891 a.C. comprou de Semer o monte Samaria e ali construiu a capital do Reino (Samaria) – ver 1 Rs 16, 23 – 26.

Foi um período de grande euforia e grandeza do Reino de Israel devido à “prosperidade” econômica. Amri manteve um controle curto sobre o país de Moab.

Amri reinou onze anos, mas sua dinastia ficou por 3 gerações (total: 33 anos!). Foi o único rei de Israel que assumiu o trono por decisão democrática (aclamação pelo povo), após o suicídio de Zambri.

ACAB (874 – 853 a.C.) – ver 1Rs 16, 29 – 22, 40

Exerceu uma política de exploração e violência, sendo ambicioso e sem escrúpulos (veja o episódio da vinha de Nabot em 1Rs 21, 1 – 29). O rei foi condenado pelo profeta Elias e o cumprimento da condenação do profeta chegou a seu tempo (2Rs 9, 22 – 26).

O rei “se arrependeu e fez “penitência” e obteve a misericórdia do Senhor.

Acab casou-se com Jezabel, princesa fenícia de Sidon e adotou o culto a Baal.

Jezabel promoveu uma violenta perseguição e extermínio aos profetas do Senhor.

Abdias, alto funcionário da corte, protegeu muitos profetas (1Rs 18, 9 – 15).

Durante seu reinado ocorre o “ciclo de Elias” (1Rs 17 – 19; 21; 2Rs 1, 1 – 2; 18).

Acab mostrava certo desprezo pelo Senhor (Aliança) e colocava sua confiança nas armas (veja os textos de 1Rs 20 e 22).

Entretanto, cumpre-se a palavra de Elias em relação a Acab: 1 Rs 22, 28 – 38; 21, 19.

Seu filho Ocozias reinou apenas um ano (853 – 852 a.C.) e Jorão (irmão de Ocozias) assumiu o Reino de Israel.

Eliseu, o profeta, ungiu Jeú como rei de Israel, que, depois, foi aclamado pelo povo (2Rs 9, 1ss; 9, 11ss). Jeú usurpou o trono e exterminou a família real, inclusive Jezabel

(2Rs10, 1 – 36).

 JEÚ (841 – 814 a.C.) – ver 2Rs 9, 1 – 10, 36

Inaugurou a dinastia mais longa de Israel: 4 gerações e 98 anos! Teve o apoio do profeta Eliseu, fundamental para manter o governo equilibrado.

Enfrentou guerra contra a Síria (Aram = Damasco), mas perdeu algumas cidades para Bem-Adad III, rei sírio (2Rs 10, 32). Foi uma época de expansão do Império Assírio: Jeú pagou tributos a Salmanasar III (imperador da Assíria);

As narrativas sobre Jeú são breves e brutais: ele era defensor irresoluto do Javismo, porém o autor deuteronomista o condena, por ele ter mantido o culto em Dã e Betel aos bezerros de ouro, conf. 2Rs 13, 6.

JEROBOÃO II (783 – 743 a.C.) – ver 2Rs 14, 23 – 29

No tempo de seu pai Joás morreu o profeta Eliseu; Joás obteve vitórias nas batalhas contra a Síria (Aram) e recuperou territórios. Cresceu a euforia diante do desenvolvimento do Reino de Israel. O rei Jeroboão II restabeleceu a extensão do Reino. A Assíria deixou de exercer influências sobre a região, por causa dos conflitos internos no Império. Com isso, Israel se fortaleceu economicamente (“milagre econômico”), aumentou a produtividade e a euforia religiosa, porém persistiam as desigualdades na distribuição dos bens produzidos.

A RUÍNA DO REINO DO NORTE:

Zacarias, filho de Jeroboão II, reinou só seis meses e foi assassinado por Selum; após um ano, Selum foi assassinado por Manaém; Manaém promoveu um governo violento por cinco anos (1Rs 15, 16). A Assíria retomou o controle sobre a Palestina.

Faceias, filho de Manaém, reinou só dois anos; Faceia, escudeiro do rei Faceias, assassinou o rei e usurpou o trono, chegando a governar por cinco anos. Faceia articulou uma coalizão contra a Assíria, reunindo outros pequenos reinos (sírios/aramitas, filisteus, amonitas, moabitas e edomitas); mas a coalizão fracassou (1Rs 15, 23 – 29), pois Acaz, rei de Judá, não aderiu à coalizão; ameaçado por Israel e seus aliados, Acaz pediu ajuda à Assíria, que subjugou a coalizão.

OSEIAS:

Homônimo e contemporâneo do profeta Oseias, foi o último rei em Israel: assassinou faceia e usurpou o trono; submeteu-se à Assíria, pagando altos tributos; tentou uma vã aliança com o Egito, para tentar se rebelar contra a Assíria.

Porém, Salamanasar V, imperador Assírio, descobriu a trama, marchou contra Israel, aprisionou Oseias e destruiu a capital (Samaria); depois, deportou a população e trouxe para Israel gente de outros povos dominados (2Rs 15, 30; 17, 1 – 6 – veja a “Origem dos Samaritanos”). Em 721 a.C. o Reino de Israel deixou de existir, sendo totalmente destruído pela Assíria.

 

Padre Éder Aparecido Monteiro

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Salomão: (+ ou – 970 – 931 a.C.; texto: 1Rs 3-11)

Continuação…

Retomando nosso estudo sobre Salomão, vejamos as características gerais do seu reinado:

– As preocupações principais eram criar um exército permanente, fixar uma capital política e religiosa, Jerusalém, e selecionar uma elite a serviço do rei;

– Acumulação: poder, terras, privilégios e luxo na corte (1Rs 5, 2 – 3; 7, 1 – 8; 10, 14 – 23)

– Tributação abusiva: o luxo da corte, a estrutura do Estado e as guerras exigiam muito dinheiro;

– Exploração sobre os agricultores e a corveia (1Rs 5, 27 – 32; 12, 4): isso vai criar a resistência dos trabalhadores;

– União com princesas estrangeiras e adoção de cultos estranhos à fé do povo (1Rs 11, 1 – 8);

– Concentração de riquezas nas mãos do rei e dos seus auxiliares;

– Uso da religião para manipular o povo (ver 1Rs 8, 1 – 13; 6 – 7)

Mais uma vez, o povo elevou seu clamor, como na escravidão do Egito. O rei se distanciava cada vez mais do povo e da periferia (Am 6, 1 – 6). A elite vai criando ideologias para oprimir ainda mais o povo, como ocorre na literatura sapiencial, por exemplo, na qual a pobreza é considerada fruto da preguiça e, portanto, uma maldição, e a riqueza, uma bênção de Deus (ver Pr 10, 4; 10, 15; 13, 18).

O resultado disso tudo era a discriminação ao pobre e desprezo ao seu clamor (Ecl 9, 13 – 16; Eclo 13, 3 – 4). Na época de Salomão, portanto, houve um retrocesso: a volta à escravidão semelhante à escravidão vivida no Egito!

 

Salomão morreu em 931 a.C.; após sua morte, houve um cisma político e surgiram dois reinos:

– no NORTE – Reino de Israel, composto pelas DEZ tribos, que se rebelaram contra Roboão, filho sucessor de Salomão (1Rs 12, 10 – 12);

– no SUL – Reino de Judá, composto pelas tribos de Judá e Benjamim, fiéis a Roboão (descendente de Davi, filho de Salomão).

 

As causas dessa divisão do Reino de Salomão foram:

  1. Impostos abusivos:

– taxas do santuário: aspecto sagrado, desde Moisés – dois tipos:

– obrigatórias: dízimo anual e tributo anual por pessoa;

– eventuais (casos especiais): taxa pelo pecado e resgates de pessoas ou bens consagrados a Deus (comutação) Ver Lv 4; 5, 15 – 16; 27, 30 – 33; Dt 14, 22 – 29.

– impostos “do rei”: meios de se apossar dos bens de seus súditos – diversas formas de exploração; Samuel já prevenira o povo desse risco: 1Sm 8, 11 – 17; Tipos:

– dízimo do rei – ver 1 Rs 10, 15; 21;Am 7, 1;

– impostos por vassalagem – ver 2Rs 15, 19 – 20; 23, 33 – 35 = casos de Manaém e Joacaz;

outros impostos: tributo territorial, tributo por pessoa e pedágios (Esd 4, 13).

  1. Violência e opressão:

– política de Salomão: cruel e opressora (corveia = trabalhos forçados);

– manipulação religiosa;

– surgimento de dois inimigos: Síria (Aram) e Edom;

– tributos para manter um exército forte e bem equipado (1Rs 11, 14 – 25);

– riqueza do rei ao lado da miséria do povo do Norte.

  1. Influências do paganismo:

– Casamentos de Salomão – número exagerado de esposas = gastos excessivos na corte;

– Inserção da IDOLATRIA no Templo de Jerusalém (deuses);

– Pactos comerciais e políticos com outros países.

  1. Escravidão: o povo do Norte tornou-se mercadoria de barganha política e econômica (1Rs 5, 20 – 25; 9, 10 – 14) e colocado como escravo do rei (1Rs 5, 27; 11, 26).

         Dois fatos marcaram o fim da era de Salomão:

1º- A rebelião contra Roboão, apoiada pelo profeta Aías, de Silo (1Rs 11, 29 – 32.37 – 38; 12, 4 – 11). O povo foi suplicar a Roboão o alívio às imposições de seu pai Salomão, mas Roboão não ouviu os clamores do povo.

2º – Jeroboão: tornou-se rei das tribos do Norte, uma espécie de “Davi do Norte”; porém, a dinastia de Jeroboão não cumpriu o ideal que Aías propôs (1Rs 11, 37 – 38), porque Jeroboão estava afeito à idolatria.

 

Pe. Éder Aparecido Monteiro