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“O Senhor fez em mim maravilhas.” (Lc 1,49)

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"A Esperança não decepciona" (Rm 5,5)

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Mensagem de Páscoa 2025 – Dom Edmilson Amador Caetano

“No primeiro dia da semana elas foram ao túmulo levando aromas…”

                 O túmulo é o símbolo da morte, símbolo do fim de todos os entraves da vida e símbolo de todas as coisas que não conseguimos vencer com as nossas forças.  Cada um pode aqui elencar os seus próprios fracassos e pecados que são comparáveis ao túmulo.

Além disso, podemos nos sentir imóveis, conformados e decepcionados com a falta de vivência dos valores do Reino na sociedade e vemos tantas conquistas desbaratadas por poderes mortíferos e a incapacidade de ter voz de anúncio do Reino, quando tantas vozes tentam sufocar a nossa fé. Tantos anos de trabalho evangelizador em Guarulhos e não vemos aparentemente fruto abundante.

As mulheres vão ao túmulo para um ritual costumeiro. Algo que pode transparecer como conformismo diante da morte que não pode ser vencida. São muitos os sofrimentos de morte em nossas vidas e vamos arcados com eles ao túmulo, como que nos conformando com as várias realidades para as quais nos sentimos inertes.

“Encontraram a pedra removida…não encontraram o corpo do Senhor Jesus.”

                A grande pedra removida e o túmulo vazio são sinais de que algo forte aconteceu.  Constatar primeiramente que a realidade de morte e fracasso pode ter novos desdobramentos é uma grande possibilidade de ir além. A primeira constatação que nos faz o anúncio pascal é que o “depósito da morte” está vazio. A morte não está ali dominando.

Quando vemos em nossas comunidades pessoas restauradas pelo amor misericordioso de Deus; jovens e adultos buscando a Palavra e serem iniciados na fé cristã; crianças animadas na catequese; uma Pastoral Familiar, com todas as suas expressões, que trazem a alegria do Evangelho da Família; jovens interessados no discernimento vocacional etc. Sentimos que, apesar do túmulo, a morte não está aí dominando.

“Cheias de medo, inclinaram o rosto para o chão…Ele não está aqui; ressuscitou…Lembrai-vos de como vos falou…É preciso que o Filho do homem seja entregue às mãos dos pecadores, seja crucificado, e ressuscite ao terceiro dia.”

Quando o improvável acontece, temos medo. Inclinamos o rosto para o chão, como reverência ao mistério ou assentimento à verdade dos fatos que não somos capazes de explicar. As palavras de Jesus, acolhidas verdadeiramente, vão nos esclarecendo e dando sentido até mesmo aos nossos momentos de fracasso e aparente derrota. Somente Jesus Cristo dá sentido à vida. Somente Jesus Cristo revela ao homem a grandeza do ser humano. Somente o anúncio da ressurreição, o anúncio do ressuscitado, nos faz caminhar por cima da morte. Somente este anúncio faz-nos passar da morte para a vida. Faz-nos fazer Páscoa.

“Elas lembraram-se das palavras de Jesus…anunciaram tudo isso aos onze, bem como a todos os outros.

É este anúncio reverberado em nós que que nos arranca ao medo e nos faz enxergar que para além dos poderes mortíferos, existe a vida que impera. Não há voz alguma que tente sufocar a nossa fé que possa imobilizar-nos. Assim, na força do ressuscitado, vamos adiante com todos os desafios e projetos de uma Igreja Sinodal que intensifica sua vida na comunhão, participação e missão.

“As outras mulheres que estavam com elas disseram-no também aos apóstolos; essas palavras, porém, lhes pareceram desvario, e não lhes deram crédito.”

Neste ano, no qual na Vigília Pascal, proclamamos este trecho do evangelho segundo Lucas, onde as mulheres são apresentadas como primeiras anunciadoras da ressurreição, mostrando-nos todo um processo que vai da decepção e do medo à força extraordinária do anúncio, apesar da incredulidade dos apóstolos. Quero recordar a importância da expressão de fé da alma feminina apresentada nas Escrituras, desde o Antigo Testamento aos relatos da ressurreição, passando pela atuação das mesmas na Igreja nascente até o Documento Final do Sínodo de 2024. Num dos trechos deste documento está dito:

“As mulheres constituem maioria daqueles que frequentam as igrejas e são, constantemente, as primeiras testemunhas da fé nas famílias. São ativas na vida das pequenas comunidades cristãs e nas paróquias; …contribuem para a investigação teológica e estão presentes em posições de responsabilidade nas instituições ligadas à Igreja…Há mulheres que exercem cargos de autoridade ou são responsáveis pela comunidade.”  (Documento Final 60).

Vejamos com olhar pascal as mulheres das nossas comunidades. A presença delas e seu testemunho de fé no ressuscitado faz-se presente nas nossas paróquias e comunidades, na vida consagrada, nas novas comunidades e nas diversas pastorais. Graças ao testemunho de fé de tantas mulheres o simbolismo do túmulo vai se redefinindo.

“Pedro…correu ao túmulo…viu apenas os lençóis…voltou para casa, muito surpreso com o que acontecera.”

Celebramos a Páscoa de 2025, ano jubilar da Esperança. Ao terminarmos as celebrações voltamos às nossas casas. Como estamos voltando? Transformados pela ressurreição e fortes para o anúncio, como as mulheres? Apenas surpresos como Pedro, indagando sobre os acontecimentos? Será que voltamos somente satisfeitos por termos cumprido o preceito, após as penitências da Quaresma e prontos para voltar ao modo antigo de vida, isto é, longe da comunidade, longe dos compromissos de vida cristã? Voltar como as mulheres seria o ideal. Voltar como Pedro seria um bom começo. Já a terceira possibilidade nos faria voltar para diante do túmulo com todo o seu antigo simbolismo.

FELIZ PÁSCOA!

O SENHOR RESSUSCITOU VERDADEIRAMENTE, ALELUIA!

+ Edmilson Amador Caetano, O. Cist.

Bispo diocesano de Guarulhos

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Peregrinos da Esperança ou Peregrinos de Esperança? Continuação…

A nossa reflexão continua a do último mês. Seria bom relê-la.

Leia: (Artigo – Março 2025)

Retomemos o texto inspirador do Jubileu da Esperança:

“…justificados pela fé, estamos em paz com Deus por nosso Senhor Jesus Cristo, por quem tivemos acesso, pela fé, a esta graça, na qual estamos firmes e nos gloriamos na esperança da glória de Deus. E não é só. Nós nos gloriamos também nas tribulações, sabendo que a tribulação produz a perseverança, a perseverança a virtude comprovada, a virtude comprovada a esperança. E a esperança não decepciona, porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado. (Rm 5,1-5)

O dom infuso da fé não pode estar desunido daquele da esperança. Faz parte do conteúdo da nossa fé gloriar-se “na esperança da glória de Deus”. A adesão e a vivência da nossa fé nos colocam em perspectiva escatológica, pois “se temos esperança em Cristo somente para esta vida, somos os mais dignos de compaixão de todos os homens.” (1Cor 15,19) A vitória de Cristo em tudo e em todos é a esperança que nos move ao combate pela fé a cada dia. Nos faz ter sempre disposição renovada em realizar os sinais de esperança. É a nossa segurança. De fato, uma das imagens mais antigas para indicar a esperança é a âncora. Uma embarcação firmemente ancorada não soçobra mesmo nas mais furiosas tempestades.

A esperança da glória de Deus faz parte do conteúdo da fé exatamente pelo fato de não nos deixar inertes diante da situações que devemos enfrentar com a luz da fé. Entretanto, a virtude teologal da esperança torna-se completa em nós, exatamente, quando nos movemos pela fé, afinal nos recorda o apóstolo Tiago que a fé sem obras é morta. Esta é uma forma de entendermos a continuidade do texto da carta aos Romanos: “E não é só. Nós nos gloriamos também nas tribulações, sabendo que a tribulação produz a perseverança, a perseverança a virtude comprovada, a virtude comprovada a esperança.”

Para “ativar” em nós a virtude teologal infusa da esperança não podemos deixar-nos cair no imobilismo diante das respostas que somos chamados a dar, nas mais variadas e adversas situações. Combater pela fé e defender a fé fazem parte desta “ativação”.

O pecado da omissão, nas palavras, nas atitudes e nos atos, nos impede de ser Peregrinos de Esperança.

 

Dom Edmilson Amador Caetano, O. Cist.

Bispo diocesano

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Peregrinos da Esperança ou Peregrinos de Esperança?

Nós, cristãos católicos, neste Ano Jubilar somos chamados a ser, sim, Peregrinos de Esperança. O Peregrino da Esperança é aquele que está em busca da Esperança que não decepciona. O Peregrino de Esperança já possui a Esperança e, portanto, dela transborda e manifesta os sinais da Esperança e a significa para a humanidade.

De fato, “…justificados pela fé, estamos em paz com Deus por nosso Senhor Jesus Cristo, por quem tivemos acesso, pela fé, a esta graça, na qual estamos firmes e nos gloriamos na esperança da glória de Deus. E não é só. Nós nos gloriamos também nas tribulações, sabendo que a tribulação produz a perseverança, a perseverança a virtude comprovada, a virtude comprovada a esperança. E a esperança não decepciona, porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado. (Rm 5,1-5)

Neste texto que inspira o Jubileu da Esperança, a primeira coisa que se nos apresenta e nos diferencia em sermos Peregrinos de Esperança e não Peregrinos da Esperança, é a outra virtude teologal que nele aparece: a fé. Duas vezes aparece a expressão “pela fé”. O próprio apóstolo Paulo em outros textos diz que a fé vem pelo ouvido e pela pregação. A fé que temos foi em nós infusa pela ação do Espírito Santo através da pregação da Igreja que ouvimos com nossos ouvidos.

A fé é a nossa resposta de adesão àquilo que nos foi pregado e entrou de modo avassalador em nossos corações, pois o anúncio da salvação por Jesus Cristo proporcionou-nos o encontro, não como uma ideia ou ideologia, mas com a pessoa deste nosso Deus, Senhor e Salvador e, que, de alguma maneira, transformou a nossa existência. A nossa “justificação” vem através desta fé, pois nossa adesão ao Senhor Jesus, faz-nos sentir amados e perdoados, não obstante a situação de morte e infelicidade que nos colocaram os nossos pecados. Isso, seguramente, não aconteceu somente uma vez, mas várias vezes, sempre que esta pregação reverberou e ainda reverbera dentro de nós.

Então, a primeira coisa que nos faz Peregrinos de Esperança é a nossa fé. A fé que vence o mundo, como nos diz São João. Esta fé tem um conteúdo, possui uma maneira de enxergar o mundo com os olhos de Deus e acreditar no amor do Pai, aquele amor que o “pai da mentira”, desde o princípio tenta fazer com que duvidemos. A vivência da nossa fé nos faz testemunhas do amor que é mais forte do que a morte. Nenhuma situação de morte neste mundo pode destruir este amor que acreditamos.

Convido a cada um e a cada uma a fazer memória em sua vida daquele ou daqueles momentos em que o anúncio de Jesus fez com que você acreditasse no amor, pois se sentiu amado e amada por Deus. Este é um primeiro passo para entendermos a nossa identidade de Peregrinos de Esperança e não de Peregrinos da Esperança.

Dom Edmilson Amador Caetano

Bispo diocesano

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Não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal

Perdoai-nos as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido. A primeira coisa a recordar aqui é gramatical. Dizemos “perdoai-nos” (reflexivo, suplicante) e não “perdoai” (imperativo, como que ordenando). Quem é verdadeiramente filho de Deus, recebeu a natureza divina (revestiu-se de Cristo) e experimentou tantas e tantas vezes na vida o perdão. Deus é Aquele que perdoa e, se tenho a natureza de Deus, também sei perdoar. Tenho a capacidade de perdoar como um dom. Se não se vive de acordo com a natureza divina, não se é filho “do Pai que está nos céus”, mas se deixa conduzir pelo pai da mentira.

Não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal. É preciso distinguir e discernir entre ser tentado e cair em tentação. Jesus foi tentado, é verdade que para nós pecadores é muito tênue a linha que separa o ser tentado e cair em tentação. Remeto a dois textos bíblicos que, com uma boa Leitura Orante, podem nos ajudar: 1Cor 10,12-13 e Tg 1,2-15. Deus não nos tenta, mas permite a tentação em nossas vidas para que com firme decisão da nossa vontade, optemos e comportemo-nos como filhos do Pai que está no céu, pois estamos enxertados naquele que por nós foi tentado, Jesus Cristo, o Filho Unigênito do Pai.

A última parte desta petição do Pai nosso, mas livrai-nos do mal, é bem distinta da tentação. As tentações podem nos levar ao pecado. Há sempre possibilidade de conversão, se assim o quisermos. Entretanto, o MAL que aparece nesta petição do Pai Nosso não é simplesmente coisas ruins que nos podem acontecer. Aqui se trata de uma tentação especial, a tentação por excelência: a apostasia. Abandonar a fé, a confiança no amor do Pai. Este MAL é “personificado”, é o MALIGNO, satanás, o demônio, o pai da mentira que nos quer “arrancar” a filiação que recebemos. O grande momento desta tentação chega em nossa vida quando abandonamos a oração e buscamos “outros deuses”. Jesus não foi tentado somente no deserto, mas sua agonia no Getsêmani foi um terrível combate. Ele mesmo exorta seus discípulos e a nós: “Vigiai e orai para não entrar em tentação: o espírito está pronto, mas a carne é fraca.” (Mc 10,38)

Assim terminamos as breves reflexões sobre as petições do Pai Nosso que fizemos ao longo deste ano, como preparação para o Ano Jubilar de 2025. Não é possível ser “peregrinos de esperança” se o nosso coração não está entregue nas mãos misericordiosas do Pai. Que todos possamos iniciar em comunhão com a Papa Francisco o Ano Santo na Noite de Natal de 2024 e, em comunhão com toda a Igreja (todas as dioceses farão neste dia), no domingo dia 29 de dezembro, festa da Sagrada Família, às 15h, congregados na Igreja NS do Rosário (centro de Guarulhos) e fazermos a primeira peregrinação jubilar até a Catedral onde celebraremos a Eucaristia.

 

Dom Edmilson Amador Caetano

Bispo diocesano

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‘‘Santificado seja vosso nome’’

Nas reflexões anteriores foram colocadas as disposições essenciais para podermos dizer “Pai Nosso que estais nos céus”. As petições do Pai Nosso estão intimamente relacionadas com estas disposições.

            “Santificado seja o vosso nome”.  Pedir que o nome de Deus seja santificado é o mesmo que pedir que isso aconteça através de nós. Pedimos também que ele seja santificado em todos os homens. Aqui está implícito o amor ao inimigo.

            “Venha a nós o vosso Reino. Seja feita a vossa vontade, assim na terra como no céu.” Pedir que venha o Reino é o mesmo que pedir que a vontade de Deus seja feita. O Pai Nosso possui também uma dimensão escatológica. O Reino já está no meio de nós, mas não chegou à plenitude. É preciso vivenciar os valores do Reino proclamado por Jesus, até “vermos a Deus tal como Ele é” (cf. 1 Jo 3,12). Para conquistar o Reino é preciso “fazer-se violência”: “Desde os dias de João Batista até agora, o Reino dos Céus sore violência os violentos se apoderam dele.” (Mt 11,12) O que é “fazer-se violência?”: negar-se a si mesmo, tomar sua cruz; ser pobre em espírito; pedir também por aqueles que não creem ; que o nosso corpo não esteja a serviço da iniquidade; não servir a Deus e ao dinheiro; combater a soberba que faz com que nos erijamos em deus de nós mesmos…

            “O pão nosso de cada dia nos dai hoje”. Pedir o pão cotidiano é um gesto de humildade e pobreza, pois buscamos o necessário para o nosso sustento. Expressa confiança na Providência e ao mesmo tempo uma renúncia ao “deus” deste mundo que é o dinheiro. Quando Deus dá o maná ao seu povo no deserto, ordena que recolham o necessário para cada dia. Quando, por ganância, recolhem mais que o necessário, o maná apodrece (cf. Ex 16,1-20). Convém reportar aqui um precioso ensinamento do Catecismo da Igreja Católica: “De cada dia”. Esta palavra, ‘epiousios’ (em grego), não é usada em nenhum outro lugar no Novo Testamento…Tomada em sentido qualitativo, significa o necessário à vida, e, em sentido mais amplo, todo bem suficiente para a subsistência. Literalmente (supersubstancial), designa diretamente o Pão da vida, o Corpo de Cristo. ‘remédio de imortalidade’, sem o qual não temos Vida em nós… “A Eucaristia é o nosso pão cotidiano. A virtude própria deste alimento divino é uma força de união que nos vincula ao Corpo do Salvador e nos faz seus membros, a fim de que nos transformemos naquilo que recebemos… Este pão cotidiano está ainda nas leituras que ouvis cada dia na Igreja, nos hinos que são cantados e que vós cantais. Tudo isso é necessário à nossa peregrinação. O Pai do céu nos exorta a pedir, como filhos do céu, o Pão do céu. Cristo é ele mesmo o pão que, semeado na virgem, levedado na carne, amassado na paixão, cozido no forno do sepulcro, colocado em reserva na Igreja, levado aos altares, proporciona cada dia aos fiéis um alimento celeste.” (CIC 2837).

Deste modo o próprio Cristo é o alimento que precisamos para segui-Lo, cada dia. Afinal, Ele exige: “se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo e tome sua cruz, cada dia…” (Lc 9,23)

Na próxima reflexão, já proximamente antecedendo a abertura do Ano Santo, refletiremos sobre as últimas petições do Pai Nosso.

 

Dom Edmilson Amador Caetano, O. Cist.

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‘‘Pai Nosso que estais nos Céus’’ 2

Faço algumas últimas considerações sobre algumas exigências para poder rezar o Pai Nosso.

Como Jesus, elevar os olhos aos céus. Não fisicamente, pois os céus não estão dentro do nosso espaço físico-temporal. Estamos diante do Deus onipresente e onisciente. Aquele que é perfeito e misericordioso. (cf Mt 5 e Lc 6). Não podemos sequer comparar o Pai que está nos céus com o nosso pai terreno. Pode ser até que muitos de nós possamos ter experiências traumáticas em relação ao nosso pai terreno, o que pode provocar uma imagem distorcida  do Pai que está nos céus. E, assim, desta maneira, duvidarmos do amor do Pai e rezarmos desacreditados do amor e  ouvintes da catequese do pai da mentira, que fez a humanidade não acreditar no amor e que em tantas circunstâncias diante da nossa história, nos faz duvidar que o amor do Pai esteja presente: “Jesus respondeu: Se Deus fosse vosso pai, certamente  me amaríeis, pois é da parte de Deus que eu saí e vim. Eu não vim de mim mesmo; foi Deus quem me enviou. Por que não entendeis minha fala? É porque não sois capazes de escutar minha palavra. Vós tendes por pai o diabo, e quereis fazer o que o vosso pai deseja. Ele era homicida desde o princípio  e não permaneceu na verdade, porque nele não há verdade. Quando ele fala mentira, fala do que é próprio dele, pois ele é mentiroso e pai da mentira.” (Jo 8, 42-44) Portanto, elevar os olhos aos céus é ter uma atitude interior de total entrega e confiança no amor do Pai.

Erguer mãos puras. “Quero, pois, que, em toda parte, os homens orem, erguendo mãos santas, sem ira nem contenda.” (1Tm 2,8) O Pai que está nos céus, não é o Deus da vingança, que faz a história mover-se pela economia do ódio. Em Mt 5,21-48, temos os vários “ouvistes o que foi dito…eu porém vos digo”. É Jesus mostrando o pleno cumprimento da Lei, não a abolindo. O versículo 48 conclui esta seção dizendo: “Sede, portanto, perfeitos como vosso Pai celeste é perfeito” e Lucas em 6,36, conclui os mesmos ensinamentos, traduzindo e esclarecendo a perfeição com a misericórdia: “Sede misericordiosos como vosso Pai é misericordioso”.

Erguer mãos puras, portanto, significa aceitar o mistério da Cruz de Jesus e estar concorde que o amor nesta dimensão de Cruz traduz a perfeição e a misericórdia do Pai. Até o gesto de erguer as mãos para a oração do Pai Nosso faz com que nosso corpo assuma a forma de cruz e mostrar as palmas das mãos, rezando como o Senhor nos ensinou, deve expressar, ao menos, o desejo de não termos ódio no coração e que chamamos a Deus de Pai, no mesmo espírito do amor de Jesus, erguendo mãos puras.  Que a intensidade deste desejo seja realmente sincera, pois nem sempre nossas mãos estão puras!

O evangelista Mateus várias vezes usa as expressões “o Pai que está no céus”, “vosso Pai celeste”. Parece querer ensinar que a comunidade dos discípulos de Jesus é a comunidade do Pai que está nos céus. Somente no capítulo 18 aparece  sete vezes a expressão. No término do ensino do Pai Nosso em Mateus, aparece a condição para que oração do Senhor seja, digamos, “bem rezada: “Com efeito, se perdoardes as faltas aos outros, também vos perdoará o vosso Pai que está nos céus. Se vós, porém, não perdoardes aos outros, vosso Pai também não perdoará as vossas faltas.” (Mt 6, 14-15)

 

Dom Edmilson Amador Caetano, O.Cist.

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‘‘Pai Nosso que estais nos Céus’’

Assim falou Jesus. Então levantando os olhos ao céu disse: “Pai, chegou a hora. Glorifica teu filho para que teu filho te glorifique, assim como lhe deste autoridade sobre todo ser humano, para que conceda a vida eterna a todos que lhe deste. Ora, a vida eterna é esta: que conheçam a ti, o Deus único e verdadeiro e àquele que tu enviaste, Jesus Cristo.” (Jo 17,1-3)

O apóstolo e evangelista São João, nesse lindo capítulo 17 do seu evangelho, revela-nos, na chamada oração sacerdotal, a intimidade, confiança e entrega de Jesus para com o Pai (Abbá, papaizinho). Jesus ergue os olhos aos céus. Ele tem a intimidade de penetrar no aconchego do Pai. Trata-se de um olhar de confiança e entrega. Mesmo na hora cruciante da sua Paixão, Ele não duvida da sua missão e da força da sua entrega. Sabe que a sua glória e a glória do Pai são a mesma: toda a humanidade tem acesso à vida eterna. Conhecendo (experimentando) o amor do Pai e do Filho, temos a mesma intimidade, pois experimenta-se a vida eterna. Tem vida eterna quem descobre o poder do Amor do Filho que se manifestou maravilhosamente no escândalo da Cruz.

A filiação divina de Jesus, da intimidade que Ele tem com o Pai, ele quer que nos tornemos partícipes.  Ele quer compartilhar com todos os discípulos: “Eu lhes dei a glória que tu me deste, para que eles sejam um, como nós somos um, eu neles e tu em mim. Sejam consumados na unidade, e o mundo reconheça que tu me enviaste e os amaste como amaste a mim.” (Jo 17,22-23).

Contudo, o penetrar nesta intimidade do Pai exige que tenhamos o conhecimento do Filho para contemplarmos a intimidade do Pai. “Há tanto tempo estou convosco e tu não me conheces, Filipe? Quem me vê, vê o Pai.” (Jo 14,9). Quem é o Filho?  É Aquele que Deus, após ter falado de muitos modos no passado, “nestes dias que são os últimos, falou-nos por meio do seu Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas e pelo qual também criou o universo. Ele é o esplendor da glória do Pai, a expressão do seu ser. Ele sustenta todas as coisas com sua palavra poderosa.” (Hb 1,2-3). Este Filho é o Verbo (Lógos) incomensurável. Ele é a Sabedoria de Deus. No entanto, o Verbo (Lógos) se fez carne e habitou entre nós. (cf. Jo 1,14). Para que pudéssemos conhecê-lo, neste seu fazer-se carne, assumiu toda a debilidade da natureza humana, exceto o pecado. Viveu o mais profundo e verdadeiro esvaziamento de si mesmo (kênosis) e por isso Ele e com Ele a natureza humana entrou na glória da eternidade. De fato, na morte de Jesus o véu do templo que impedia a todos de entrar em contato com Deus rasgou-se. Pelo poder da morte, morte de Cruz de Jesus, todos têm acesso ao Pai. (cf Mt 27,51) E o Cristo que assumiu a nossa frágil natureza humana é exaltado e diante dele todos os joelhos se dobram. “…não considerou um privilégio ser igual a Deus, mas esvaziou-se, assumindo a forma de servo e tornando-se semelhante ao ser humano…humilhou-se, fazendo-se obediente até a morte – e morte de Cruz! Por isso Deus o exaltou acima de tudo e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que, ao Nome de Jesus, todo joelho se dobre no céu, na terra e abaixo da terra, e toda língua confesse: Jesus Cristo é o Senhor para a glória de Deus Pai.” (Fl 2,6-11)

Este é o Filho que precisamos conhecer (experimentar) para que a nossa oração do Pai Nosso tenha toda a sua intensidade. Somos filhos no Filho. Somente estando nele podemos chamar a Deus de Pai.

 

Dom Edmilson Amador Caetano, O. Cist.

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A quem ousamos chamar de Pai?

Em nossa última reflexão, onde falávamos sobre o Pai Nosso, tema central da oração neste ano em que nos preparamos para o Ano Santo de 2025, refletíamos sobre a nossa grandeza de filhos de Deus e como que, em Cristo, podemos chamar a Deus de Pai. Entretanto, unido a esta grandeza está a dificuldade de ouvirmos o “outro pai”, o pai da mentira. Em Jo 8,43-45, Jesus falando aos que haviam acreditado nele (cf. Jo 8,31), diz: “Por que não entendeis a minha fala? É porque não sois capazes de escutar minha palavra. Vós tendes por pai o diabo e quereis fazer o que vosso pai deseja. Ele era homicida desde o princípio e não permaneceu na verdade. Quando ele fala mentira, fala do que é próprio dele, pois ele é mentiroso e pai da mentira. Em mim, ao contrário, não credes, porque falo a verdade.”

Impressionante! Jesus não fala aos que diziam não acreditar nele, mas àqueles que diziam ter crido nele. Então, esta Palavra toca a nós sempre muito de perto, pois professamos acreditar em Jesus. E, tantas vezes, como testemunham os nossos pecados, realizamos as obras do pai da mentira. Isso nos impede, tantas vezes, de chamar a Deus de Pai.

Na última reflexão tivemos a ajuda de São Cipriano de Cartago na sua bela exposição sobre a Oração do Senhor. Desta vez quero buscar a ajuda de um dos grandes Santos Padres Capadócios do século IV, São Gregório de Nissa, através da sua homilia sobre o Pai Nosso: Que coração devemos ter para esta palavra “Pai”! É evidente que nenhum homem sensato se permitirá usar o vocábulo “pai” se reconhece que não se assemelha em nada a Ele…Se alguém que aspira à purificação entra em si mesmo e descobre a própria consciência repleta de vícios e imundície e, apesar de se reconhecer pecador, diz que tem tal parentesco com Deus, que pode chamar de “Pai”  Áquele que é a pureza, sem se purificar previamente de suas próprias prevaricações, tal homem será um presunçoso e um blasfemo, porque chama a Deus de pai de sua própria iniquidade, Porque ao nome de pai está atribuindo a responsabilidade da sua perversão…Se te apegas ao dinheiro, se te deixas arrastar pela sedução do mundo, se buscas a estima dos homens, se te deixas levar pela concupiscência da carne e depois rezas a oração do Pai Nosso, o que pensará Aquele que escruta teu coração enquanto escuta tuas palavras?…É perigoso, pois, antes de se ter corrigido a própria vida, recitar esta oração e ter a OUSADIA de chamar a Deus: Pai.”  (S. Gregório de Nissa, II Homilia sobre a Oração do Senhor)

Esta “periculosidade” no rezar o Pai Nosso é patente em nossas vidas. Somos pecadores. No entanto, em Jesus Cristo estão sempre abertas as portas da conversão e da vida nova. Jesus Cristo é o Filho de Deus. Somente NELE, aderindo ao seu Evangelho é que podemos dizer Pai Nosso. Somos filhos no Filho. A fórmula litúrgica do convite à oração do Pai Nosso fala sempre em ousadia, pois no amor de Cristo temos sempre acesso ao Pai: “Obedientes à palavra do Salvador e formados por seu divino ensinamento OUSAMOS dizer.” “Guiados pelo Espírito de Jesus e iluminados pela sabedoria do Evangelho OUSAMOS dizer.

Sejamos ousados para renunciar ao pai da mentira. Sejamos ousados, mesmo com a indignidade a que nos submetem os nossos pecados, a estarmos diante do Pai por Cristo e em Cristo. Em verdadeiro espírito de conversão sejamos sempre ousados em dizer PAI NOSSO.

 

Dom Edmilson Amador Caetano, O. Cist.

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Ter olhos fixos em Jesus

No mês passado refletíamos sobre como não é possível rezar como convém sem termos os olhos fixos em Jesus “autor e realizador de nossa fé”. Ter olhos fixos em Jesus equivale à obediência da fé. Não é possível a oração verdadeiramente cristã sem a fé.

Os discípulos de Jesus querem que Ele lhes ensine a rezar (cf. Lc 11,1). Jesus ensina a oração do Pai Nosso que não está, absolutamente, desvinculada da vida de fé.

De fato, para chamarmos a Deus de Pai são exigidas algumas disposições interiores que refletem o nosso modo de viver.

Não podemos chamar a Deus de Pai se não estivermos em Cristo. Ele é o Filho Único do Pai. Nós só podemos ser filhos de Deus no Filho. Em Cristo tornamo-nos filhos adotivos. O Batismo, somente o Batismo, nos faz filhos de Deus, pois por este Sacramento somos enxertados no Cristo e nos tornamos criaturas novas. “O homem novo, renascido e restituído a Deus pela sua graça, diz, logo de início, Pai, porque já começou a ser filho...Devemos, irmãos diletíssimos, considerar e entender que não só chamamos de Pai aquele que está nos céus, mas que apontamos e dizemos Pai nosso, isto é, (pai) daqueles que creem, daqueles que foram santificados por ele mesmo e que, restaurados pelo nascimento da graça espiritual, começaram a ser filhos de Deus.” (cf São Cipriano de Cartago, Da Oração do Senhor 9-10)

É evidente que o foi dito acima exige a fé, pois a consciência da graça batismal e a sua atividade em nós exige a nossa total adesão. Por outro lado, é também evidente, que não basta ter recebido o Sacramento que nos faz filhos de Deus, mas é preciso viver de acordo com a graça recebida. Isso também é condição para podermos chamar a Deus de Pai. “Como é grande a indulgência do Senhor! Ele nos envolve com a abundância do seu favor e da sua bondade. A ponto de querer que, ao elevarmos a Deus nossa oração, chamemos Deus de Pai: de modo que, se dizermos que Deus é Pai, precisamos agir como filhos de Deus, para que, do mesmo modo que nos alegramos de Deus Pai, ele também se alegre de nós. Vivamos, pois, como templos de Deus, para que se note que ele habita em nós. Que nossa ação não seja indigna do Espírito, para que nós, que começamos a ser celestes e espirituais, não pensemos e pratiquemos o que não é celeste, nem espiritual… O bem-aventurado apóstolo diz na sua carta: ‘Não sois vossos. Fostes comprados por um grande preço. Glorificai a Deus e levai-o no vosso corpo. (1Cor 6,19-20) (cf. São Cipriano de Cartago, Da Oração do Senhor 11)

Aquele que está em Cristo chama a Deus de Pai (Abbá, paizinho), com toda a confiança filial, não duvidando do amor e já renunciou ao pai da mentira, mentiroso desde o início, pois faz o homem, imagem de Deus, desacreditar do amor. (cf Jo 8,39-47) Para verdadeiramente chamar a Deus de Pai, precisamos renunciar ao demônio, pai da mentira.

 

Dom Edmilson Amador Caetano, O.Cist.

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‘‘A Esperança não decepciona’’ É o tema da Bula do Papa para 2025

No último dia 09 de maio Papa Francisco tornou pública a Bula “Spes non confundit” (A esperança não decepciona), com a qual convoca o Jubileu Ordinário de 2025 (Ano Santo): Peregrinos da Esperança.

O título da Bula é tirado do texto de Rm 5,1-11, onde a esperança pressupõe a fé, pois, diz Paulo:

“justificados pela fé estamos em paz com Deus por nosso Senhor Jesus Cristo, por quem tivemos acesso, pela fé, a esta graça, na qual estamos firmes e nos gloriamos na esperança.” (Rm 5,1-2)

A fé é como a porta de entrada para se possuir a esperança que não decepciona. Afinal,

a esperança não decepciona, porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado.”  (Rm 5,5),

e Deus concede o Espírito Santo aos que lhe obedecem (cf At 5,32) e esta obediência, é a obediência da fé.

Inspirados nesta Bula pontifícia podemos continuar falando da oração na perspectiva de que falávamos no mês passado: a vivência da fé. Inspiremo-nos em Mt 14,22-33.

Os discípulos alegres e festivos pela multiplicação dos pães (cf  Mt 14,13-21) são forçados por Jesus a entrarem na barca e fazer a travessia (cf. Mt 14,22). A vida cristã, a vida do discípulo de Jesus não é um deter-se na festa, mas no combate da fé, no entrar na morte (da qual as águas são um símbolo). Jesus apresenta-se aos discípulos caminhando sobre as águas no meio da tempestade (cf Mt 14,25).  Jesus é vencedor sobre o mal e a morte. Os discípulos amedrontados (sem fé) dizem que é um fantasma, pois somente um fantasma pode estar no meio da morte (sem esperança de vida eterna). Jesus identifica-se como Aquele que é – SOU EU -, convidando-os à obediência da fé (a não ter medo) e o apóstolo Pedro quer fazer a experiência de caminhar sobre as águas, de caminhar por cima da morte, de entrar na morte experimentar a vida eterna (cf. Mt 14,28). De fato, Pedro caminha sobre as águas e vai ao encontro de Jesus (cf Mt 14,29). No entanto, ao se entregar à preocupação dos acontecimentos de morte (cf. Mt 14,30), começa a afundar. É que ao entregar-se ao medo da morte, deixa de olhar para Jesus e olha para si mesmo. Enquanto mantinha o olhar em Jesus caminhava sobre as águas. Ao deixar de viver a obediência da fé, deixa também de ter a esperança e entra no desespero.

Não deixemos de pedir em nossa oração que o Senhor nos conceda hoje ter a vida eterna e não afundarmos nos acontecimentos de morte. No entanto, devemos ter sempre os olhos fixos no Senhor Jesus, para deixarmo-nos conduzir por sua Palavra e vive-la no cotidiano da nossa existência. A vida eterna é para hoje. A esperança que não decepciona nos faz viver hoje e caminhar sobre a morte.

“…corramos com perseverança para o certame que nos é proposto, com os olhos fixos naquele que é o autor e realizador da fé, Jesus…” (Hb 12,1-2)

 

Dom Edmilson Amador Caetano, O. Cist.

Bispo diocesano