SÃO PAULO - BRASIL

“O Senhor fez em mim maravilhas.” (Lc 1,49)

SÃO PAULO - BRASIL

"O Senhor fez em mim maravilhas." (Lc 1,49)

Categorias
Artigos Falando da Vida

Criança feliz, sem celular!

Os riscos dos Smarphones para crianças

Parece que o mundo finalmente está descobrindo algo que parecia claro, isto é, o uso indiscriminado de Smartphone por crianças e adolescentes é prejudicial ao seu desenvolvimento físico e mental. Quase um quarto dos países já proibiram os smartphones nas escolas e alguns estados brasileiros criaram restrições ao seu uso. É indiscutível que o emprego de tecnologias pode auxiliar no desempenho de tarefas escolares, porém o uso de celulares perdeu a sua função principal e está causando sérios problemas nas crianças. Queda do aprendizado, dificuldades de concentração, redução da interação social, insônia, depressão e ansiedade.

Felizmente o debate que discute o banimento do uso do celular no ambiente escolar ganha corpo e alguns países já proíbem o seu uso. É o caso de França, Espanha Grécia, Dinamarca, Finlândia, Holanda, Itália e Suíça. No Brasil, o MEC (Ministério da Educação e Cultura) está trabalhando num projeto para proibir o uso de telefones celulares em sala de aula em todas as escolas, devendo ser anunciado brevemente.

Menos celular mais qualidade. Estudos recentes realizados no Reino Unido mostram que a proibição dos celulares aumentou significativamente as notas dos alunos, especialmente entre aqueles que tinham menor desemprenho. No Japão e na Coreia do Sul, os celulares são preparados com tecnologia especial para serem usados somente para fins pedagógicos, não permitindo o acesso às redes sociais. Em matéria exibida na Folha de São Paulo em 07/09/2024, os próprios alunos da escola Martin Luther King, no Rio de Janeiro, relataram significativa melhora, tanto no desempenho, como no relacionamento social, depois que deixaram o celular.

Proibição soa sempre como uma palavra pesada em relação à liberdade que a maioria das pessoas defende numa sociedade democrática. Mas no caso de crianças e adolescentes, o uso indiscriminado de tecnologias como smartphones, tem se tornado um assunto que envolve não só uma questão de desempenho escolar, mas sim, de saúde mental e física. Algo precisa ser feito com urgência e a mudança pode começar em casa com os adultos que são os modelos mais importantes.

Desconectando: Por que trocar a vida real que está se revelando à nossa frente por uma falsa experiência de mundo paralelo que a tela nos impõe? Evite o uso do celular na presença das crianças, priorize interações face a face e atividades que envolvam o mundo físico. Esteja sempre conectado, não com o celular, mas consigo mesmo e com o que acontece ao seu redor, afinal, essa é a única vida que importa: a vida real.

 

Romildo R. Almeida

Psicólogo clínico

Categorias
Artigos Falando da Vida

A Saúde Mental está em Jogo

O vício em apostas é um transtorno psicológico perigoso

 Os cassinos foram proibidos no Brasil em 1946 por iniciativa do general Eurico Gaspar Dutra, na época, presidente da República. A proibição tinha como objetivo, proteger a “tradição moral jurídica e religiosa” e contra os “abusos nocivos à moral e aos bons costumes”. A publicação do decreto lei, n⁰ 9.215 de 30 de abril de 1946, acabou com a chamada farra do ouro em que, nos salões lotados de pessoas da alta sociedade, se gastavam fortunas em jogos de roleta e cartas de baralho, regados a bebidas caras e charutos importados.

Se o objetivo da referida lei era proteger a população brasileira dos males produzidos pelo vício em jogos de azar, temos que admitir que ela só protegeria as camadas mais abastadas da população que tinham condições de se locomover até os grandes cassinos. No entanto, a lei não protegeu, os pobres em relação aos jogos de apostas promovidos pelo próprio governo como: Mega-sena, Lotofácil, Lotomania, etc. As “Bets online”, jogo do tigrinho, somados às outras modalidades de apostas, tornaram-se um grande perigo para a saúde mental, dada a facilidade em apostar pela internet.  Todos esses fatores somados, podem resultar numa patologia chamada de transtorno de jogos.

O que leva as pessoas ao vício é o sistema de recompensa do cérebro que libera uma substância chamada dopamina produzindo sensações de prazer. O indivíduo nessa condição passa a gastar compulsivamente acreditando que em algum momento vai atingir a sorte grande e se tornar rico. Aqui, existe um componente psicossocial importante, a maioria dos apostadores são pobres, sem expectativa de melhorar de vida através do trabalho e do esforço pessoa, para essas pessoas, os jogos são a única chance.

Estamos vivendo a Campanha do “Setembro amarelo” que trata da prevenção ao suicídio, portanto, momento oportuno para refletir sobre esse grave problema. Muitas pessoas têm perdido emprego, dinheiro, família e até praticado suicídio por causa do Transtorno de jogos. Desde 2018, a OMS – Organização Mundial da Saúde, considera esse vício como doença. Se você conhece alguém que esteja envolvido com apostas online alerte-o sobre os riscos, pois essa atividade aparentemente recreativa, pode se tornar um vício perigoso. A verdade é que quanto mais o indivíduo acredita na sorte, menos acredita em si mesmo. Por fim, a melhor aposta que podemos fazer é na busca pela serenidade e pela paz interior. De posse delas, não precisaremos de mais nada, pois já teremos o essencial para construir a verdadeira felicidade.

 

Romildo R.  Almeida

Psicólogo clínico

Categorias
Artigos Falando da Vida

Pai, por que me abandonaste?

A ausência da figura paterna na afetividade de meninos

Li, certa vez, um artigo de biologia em que o autor afirmava que a natureza teria sido muito tolerante com o sexo masculino no que diz respeito a função procriadora. O artigo apontava as diferenças de investimento energético entre o homem e a mulher na atividade reprodutiva. De fato, enquanto o papel do homem limita-se a ceder alguns espermatozoides, a mulher responde por uma parcela infinitamente maior no processo, implicando numa série de transformações no corpo, na mente, no estado emocional, além de um longo período de gestação no qual tem que se dedicar, quase que exclusivamente, à maternidade.

Logicamente, essa afirmação levava em conta apenas os aspectos biológicos presentes na reprodução humana, mas de qualquer forma é a base para entender alguns aspectos psicológicos na constituição das famílias, sobretudo se observarmos que essa pouca contribuição, também se repete nas atividades de cuidado e educação dos filhos. A presença do genitor masculino é fraca, esse distanciamento sempre foi justificado pelo papel de provedor em que o homem necessitava sair de casa para garantir sustento à família. Infelizmente, apesar das mudanças ocorridas nos últimos tempos nos modelos de família, essa desigualdade no desempenho das funções parentais ainda persiste.

Esse cenário é o pano de fundo para a triste realidade levantada no recente estudo publicado pelo UOL a pedido da Natura, onde ficou demonstrado que apenas 5 a cada 10 meninos adolescentes têm certeza do amor paterno. A pesquisa, inclusive, traz um significativo recorte de raça e etnia: os meninos negros têm menos certeza de serem amados pelo pai (49%) do que os meninos brancos (35%). A ausência física é acompanhada da frieza afetiva provocando uma dificuldade em expressar atenção e carinho de forma natural. Muitos genitores tentam compensar essa falta, dando presentes materiais, mas isso não ajuda a criança a aprender, de fato, o que é amor real e como ele se constrói.

O estereótipo masculino começa a ser construído na infância através da aprendizagem observacional, conforme teorizou o psicólogo canadense Albert Bandura na década de 60. De acordo com Bandura, as pessoas não aprendem apenas por suas próprias experiências, mas também por observar e imitar os demais. Nesse sentido, o convívio social torna-se fator relevante no desenvolvimento da personalidade. Imaginem o futuro de meninos que hoje crescem observando o distanciamento paterno associado à desvalorização do sexo feminino, violência contra a mulher, machismo, etc? Certamente, não serão cidadãos que construirão uma sociedade justa onde o respeito pelo outro prevalecerá. A presença positiva dos genitores doadores de afeto, gentileza e bondade é o caminho possível para se construir um mundo melhor.

 

Romildo R. Almeida

Psicólogo clínico

Categorias
Artigos Falando da Vida

O Inimigo está de Volta

O perigo representado pelos Vapes

Quem observa as fotos impressas nas embalagens de cigarro, fica chocado: peles necrosadas, doenças terminais, sofrimento. Essas advertências começaram a ser feitas pelo Ministério da Saúde em 2002 a partir de recomendação da OMS. A campanha surtiu efeito, já que houve queda no número de fumantes e a indústria do tabaco sofreu grandes perdas, sobretudo com as multas milionárias que teve que pagar por ter induzido milhares de pessoas a fumarem. Na década de 70 era comum ver propagandas na TV associando consumo de cigarro a sucesso, força e beleza; hoje isso é proibido.

No entanto, o inimigo está de volta revestido de nova embalagem seduzindo jovens e adolescentes. Trata-se dos cigarros eletrônicos conhecidos como “Vapes”. O vape é um dispositivo alimentado por bateria que aquece os líquidos interiores contendo nicotina, aromatizantes e outras substâncias prejudiciais à saúde. Os vapes podem ser comprados em lojas físicas ou adquiridos pela internet. A popularidade desse produto decorre da falsa ideia de que ele não faz mal, que é apenas fumaça com gostinho de frutas e de que não tem nicotina. Muitos fumantes deixaram o cigarro e passaram a fumar esses eletrônicos acreditando estarem mais seguros.

Ao contrário do que se imagina, os vapes provocam níveis de intoxicação, no organismo superiores aos do cigarro convencional. Foi o que mostrou a pesquisa da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo em parceria com o Incor e a FMUSP. A análise toxicológica realizada em 200 fumantes de cigarros eletrônicos, detectou níveis de nicotina de três a seis vezes maiores do que os encontrados em usuários de cigarros convencionais. Outro problema é a dependência que o consumo de vape produz. Uma vez estabelecida, é extremamente difícil largar, devido a sensação de satisfação que ele produz no cérebro, através da dopamina.

Por que as pessoas consomem substâncias nocivas? Talvez pela curiosidade aliada ao desconhecimento dos seus malefícios, mas também pela necessidade de desafiar os perigos na busca de autonomia e liberdade. É como se tivessem a necessidade de fazer algo contrário à cartilha recomendada pela Família, pelo Estado ou pela Igreja. Vapes, narguilé e álcool são drogas que oferecem, a curto prazo, satisfação e prazer, mas com o passar do tempo, causam dependência. Faltam campanhas de conscientização a respeito dos perigos presentes nas drogas lícitas ou ilícitas. Falta entender, também que o usuário precisa de acolhimento e, em alguns casos, de tratamento psicológico, não de repressão. Por fim, falta saber que tudo que nos afasta da consciência, não é bom, pois o grande “barato” é estar plenamente consciente e celebrar a vida naturalmente.

 

Romildo R. Almeida

Psicólogo clínico

Categorias
Artigos Falando da Vida

TRAGÉDIA CLIMÁTICA NO SUL

O país se une, através da Compaixão, para ajudar o próximo.

As cenas tristes mostradas sobre a tragédia do Rio Grande do Sul, custam sair da nossa cabeça. Pessoas desesperadas depois de perderem tudo, cidades ilhadas, famílias desoladas vivendo em abrigo provisório e até animais domésticos isolados nos telhados. Se essas imagens causam comoção em quem as assiste pela TV, imaginem o que elas podem causar na mente de quem está lá, vivendo o desfecho como vítimas da catástrofe. Mesmo com o fim das cheias dos rios e a limpeza das casas, pessoas tentam voltar à vida normal, mas se deparam com outro problema: as “cheias mentais” provocadas pela tragédia que não saem da memória. A simples lembrança provoca a revivência dos acontecimentos, num fenômeno conhecido como TEPT – Transtorno do Estresse pós-traumático.

Os eventos mais propensos a causar esse transtorno, são aqueles que invocam sentimentos de medo, desamparo ou horror. Os principais sintomas incluem a revivescência repetida do evento traumático sob a forma de lembranças invasivas (“flashbacks”). Por muito tempo, as vítimas, têm pesadelos envolvendo os acontecimentos e passam a ter dificuldades para dormir devido as crises de ansiedade. A atividade social também fica comprometida pois o indivíduo acometido desse transtorno perde o encantamento pela vida e se afasta dos amigos. Até mesmo a libido é afetada dificultando relacionamentos afetivos e sexuais. São louváveis as iniciativas em todo o país para ajudar as vítimas no aspecto da reconstrução das perdas materiais, mas a reconstrução da pessoa traumatizada, também é uma etapa necessária.

Algumas pessoas com TEPT, necessitam de tratamento psiquiátrico e Psicoterapia Cognitiva para ajudar na reconstrução do bem-estar emocional e promover a resiliência necessária na superação dos desafios. Certamente, existe um turbilhão de emoções e sentimentos represados na mente de quem passou por situações desse tipo, que precisam ser expressados e validados, principalmente nas crianças. Às vezes, na ânsia de querer ajudar, passamos a dar conselhos e a narrar nossas experiências pessoais de superação, na tentativa de encorajar o outro. Mas, temos que resistir a essa tendência automática, pois o papel principal de quem fornece apoio emocional é o de oferecer-se ao outro através da compaixão acolhendo cada palavra, cada lágrima, cada gesto. Não se preocupe em dizer nada, apenas ouça, afinal o que faz uma pessoa sentir-se melhor, não são as palavras que você diz, mas o tipo de conexão que você estabelece com ela. Escutar com o coração também é uma atitude concreta de amor.

 

Romildo R. Almeida

Psicólogo clínico

Categorias
Artigos Falando da Vida

Mães adotivas

A missão de salvar uma criança.

Maio é o mês em que se comemora o Dia das Mães, por esse motivo é o mês ideal para tratar de um assunto muito importante que é a adoção de crianças. Ser mãe adotiva é um ato sublime de amor, porém requer muita responsabilidade.         Geralmente o casal que não conseguiu gerar um filho, recorre à adoção como um meio de satisfazer não só um instinto básico da natureza humana, mas também por necessidade de dar sentido à relação, através da experiência de serem pais. Às vezes na ansiedade de realizar tal desejo, muitos casais não suportam esperar pelas longas filas no processo legal de adoções e recorrem a um meio conhecido como “adoção à brasileira”.

Nesse modelo a família biológica entrega a criança a um indivíduo estranho, que provavelmente registrará a criança como filho legítimo. Péssima ideia, pois isso é crime, passível de condenação de até dois anos de detenção. A adoção à brasileira gera sentimentos contraditórios, pois ao mesmo tempo em que os novos pais se enchem de felicidade pela chegada do novo bebê, são também tomados por um medo terrível de que a família biológica venha, um dia, reclamar na justiça o direito à criança, seja por arrependimento ou por interesses financeiros.

Considerando essa possibilidade, os pais adotivos passam a tomar algumas medidas para evitar qualquer tipo de contato com a família doadora, subtraindo da criança, sua história e seu passado e, na verdade, não estão protegendo o bebê e sim a si mesmos. A criança que cresce num ambiente desses, terá dificuldades de ajustar-se afetiva e socialmente tornando-se um indivíduo com grande potencial problemático no futuro. Timidez, insegurança e ansiedade são algumas das características da criança adotada, podendo gerar diversos problemas como: depressão, problemas escolares, dificuldade de adaptação social, entre outros.

Antes de adotar uma criança, há que se ter em mente que ela não é a solução para um problema, ela não vai preencher lacunas afetivas e sentimentais, nem recompensar perdas do passado. Esperar isso, seria inverter os papéis imaginando que a criança adotada venha a ser solução para resolver conflitos pessoais. O ideal seria que os pais adotivos buscassem orientação psicológica para refletir sobre suas verdadeiras necessidades, numa atitude destemida de confronto entre desejo e realidade.

Em suma, a decisão de adotar deveria ser um processo maduro e consciente baseado no desejo de doar-se a alguém, fazendo aquilo que Jesus nos ensinou, isto é lançar-se, sem medo e sem nenhuma expectativa de recompensa, assim como fez Maria, exemplo maior de maternidade.  Esta seria uma verdadeira atitude de amor ao próximo.

 

Romildo R. Almeida

Psicólogo clínico

Categorias
Artigos Falando da Vida

Páscoa e Ressignificação

Quando o homem velho dá lugar ao homem novo.

Revendo a nossa história de vida, muitas vezes nos deparamos com experiências tristes que nos fazem pensar: Como seria bom se tivéssemos uma borracha que apagasse os nossos erros do passado, as lembranças dolorosas, os traumas e também nossas culpas. Teríamos a oportunidade de começar vida nova com um novo sentido, uma nova oportunidade. Infelizmente essa borracha não existe da maneira como imaginamos, mas a boa notícia é que podemos construir uma nova estrada, sem destruir aquela que já existia; podemos nos tornar pessoas novas e o nome dessa estrada é Ressignificação.

Ressignificar é mudar o significado dos acontecimentos através de uma postura compassiva e autocompassiva. Não é o mesmo que autoindulgência onde nos desculpamos pelos nossos erros com a tradicional atitude evasiva, representada pela frase: Errei, mas quem não erra. Ressignificar é compreender de forma profunda o nosso passado, avaliar as circunstâncias que envolveram, o nosso grau de consciência e, a partir disso, nossa vontade genuína de querer fazer diferente. A história de Saulo que passou de perseguidor de cristãos à homem piedoso e convertido, é um exemplo bíblico de tantas experiências que ocorrem em nosso meio.

Considerando a possibilidade da Ressignificação, ninguém está forçado a viver um destino manchado por um passado negativo e vergonhoso. Seja um dependente químico, um criminoso, um pervertido, etc. Não importa o quão errado você foi no passado, você pode se reconduzir à uma nova vida dando a si mesmo uma nova chance. Muitas vezes não é a sociedade que julga e sim, nós mesmos que através de uma postura crítica e pesada, condenamo-nos a viver dentro de um enredo trágico e negativo, acreditando na falsa ideia de que não podemos mudar.

Este mês de abril em que celebramos a Páscoa de Jesus poderíamos buscar força e inspiração para começar esse trabalho, uma vez que Páscoa tem a ver com mudança, transformação e renascimento. Se ampliarmos esse significado e trazê-lo para a nossa realidade, podemos dizer que Páscoa é sair de um estado de prisão para alcançar a liberdade através da Ressignificação. Então, mais do que chocolates e bombons, que a sua Páscoa seja recheada de paz, harmonia, gratidão e compaixão. Celebre esse momento deixando que morra no seu coração o homem velho ligado ao passado e ao sofrimento para dar lugar ao homem novo, pois Páscoa é vida nova.

 

Romildo R. Almeida

Psicólogo clínico

Categorias
Artigos Falando da Vida

Mulher Invisível

A invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher.

O tema da Redação do Enem de 2023 trouxe à luz uma realidade pouco discutida na sociedade, trata-se da invisibilidade do trabalho de cuidado exercido pelas mulheres no Brasil. Trabalho de cuidado é o conjunto de atividades físicas e emocionais, remuneradas ou não que garantem o bem-estar e a sustentação da vida, tais como: dar banho, alimentar, ensinar, assistir crianças ou idosos. Ao longo da história, esses trabalhos sempre estiveram relacionados ao gênero feminino. Até hoje, lavar e passar a roupa, manter a higiene da casa, preparar comida e zelar pela saúde da família, na maioria das vezes, são tarefas exercidas por mulheres. A noção de invisibilidade decorre do fato de que esses trabalhos não são reconhecidos formalmente.

Uma pesquisa feita pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) em 2023, apontou que o simples fato de ser mulher, acarreta um acréscimo de 11 horas semanais dedicadas exclusivamente aos trabalhos de cuidados que, logicamente, não são remunerados e nem entram na contagem por tempo de serviço. Outro lado da questão, é o trabalho doméstico remunerado formado pelas babás, mensalistas, diaristas, cozinheiras e cuidadoras cujo ambiente de trabalho é uma casa de família. A maioria é formada de mulheres pretas, que recebem não mais do que um salário mínimo e somente 25% possuem vínculo empregatício. Eis aqui, outro tipo de invisibilidade.

A perspectiva do futuro, não é muito animadora considerando uma sociedade que está envelhecendo e que, portanto, necessitará cada vez mais de cuidados pessoais. De acordo com a OIT (Organização Internacional do Trabalho) 2,3 bilhões de pessoas no mundo, vão precisar de cuidados diversos. Vemos, portanto, um grande campo se abrindo que precisa ser reconhecido, pois o que, antes era um privilégio de famílias abastadas, tornou-se uma necessidade, até mesmo, para famílias de baixa renda. No Brasil, a subvalorização dessa categoria de trabalhadores, em grande parte devido à falta de consciência a respeito de sua importância, trará consequências negativas.

Neste mês de março, mês em que comemoramos o Dia Internacional da Mulher, devemos aproveitar a oportunidade para apoiar a luta histórica das mulheres em busca de igualdade, no combate à violência de gênero que leva ao feminicídio e na criação de políticas públicas que garantam o seu bem-estar. Precisamos também combater o nosso próprio preconceito e discriminação, fruto da herança patriarcal que está no nosso inconsciente. Sem essa postura, as felicitações com mensagens bonitas, flores, chocolates, parabéns pelo seu dia, serão apenas atitudes vazias e sem sentido.

 

Romildo R. Almeida

Psicólogo clínico

Categorias
Artigos Falando da Vida

Por que a Guerra?

A interessante pergunta que Einstein fez à Freud.

Enquanto você lê esse artigo, milhares de pessoas estão morrendo em decorrência de guerras ou sofrendo as suas consequências. Desde 2525 a.C, quando aconteceu o primeiro conflito militar de que se tem notícia, a humanidade não parou mais de guerrear por diferentes motivos como: desentendimentos religiosos, interesses políticos, econômicos, rivalidades étnicas, etc. Além de causar mortes, as guerras provocam perdas econômicas, destruição do meio ambiente e traumas que ficam na mente dos sobreviventes.

Depois da guerra Franco-Prussiana, em 1871 que terminou com mais de 150 mil mortos, instaurou-se na Europa um movimento chamado de Belle Époque. De fato, era o sonho de uma bela época em que a humanidade viveria em paz, a partir dos avanços tecnológicos proporcionados pela Revolução Industrial. Os grandes pensadores ficaram tão otimistas que imaginavam que naquele mundo civilizado não haveria mais lugar para as guerras. No entanto, em 1914 eclodiu a primeira guerra mundial que deixou mais de 40 milhões de mortos e 30 anos mais tarde veio a segunda que matou mais de 55 milhões.

Em 1932 Albert Einstein escreveu uma carta à Sigmund Freud, criador da Psicanálise, com a seguinte pergunta: Por que a guerra? Existe alguma forma de livrar a humanidade dessa ameaça? A resposta de Freud foi desanimadora; segundo ele, existem dois instintos básicos na nossa psique: o instinto de vida ligado à preservação da mesma, chamado de Eros e o da Morte ligado a destruição, chamado de Thanatos. Esses dois princípios fundamentais se combinam e se completam de modo que um depende do outro. Por esse motivo, segundo Freud, a violência sempre acompanhará o homem no curso da sua história.

Considerando essa teoria, não devemos esperar que a paz aconteça, pois a humanidade carrega na sua constituição a semente da violência como estratégia de poder e dominação.  Violência contra seu semelhante, violência contra os animais, contra o meio ambiente e, em última análise, contra si mesmo. No entanto, não podemos viver de teorias. Precisamos acreditar na paz e construí-la de maneira simples a partir da nossa realidade. É preciso começá-la de algum lugar e o melhor lugar é dentro de nós mesmos. Precisamos ter paz interior para depois construir a paz exterior. Que a paz seja buscada, mesmo em meio a guerra, afinal, como disse o próprio Albert Einstein “Não se pode manter a paz pela força, mas sim pela concórdia. ”

Nesta última edição impressa deste jornal, quero agradecer a direção da Folha Diocesana, bem como os leitores, pela oportunidade a mim confiada, de compartilhar minhas ideias e reflexões através dessa coluna. Essa experiência me trouxe um grande aprendizado tanto na vida profissional como no aspecto pessoal. Obrigado e até breve!

 

Romildo R. Almeida – Psicólogo clínico

Categorias
Artigos Falando da Vida

Positividade Tóxica

A negação do sofrimento pode ser prejudicial à Saúde mental.

Todos devemos encarar a vida com otimismo e ter uma postura positiva frente às adversidades. Não há dúvidas de que a motivação é uma alternativa melhor do que o pessimismo em qualquer situação. Mas existe uma ideia que tem se difundido muito nos últimos tempos, principalmente nas mídias sociais. Trata-se da Positividade Tóxica que é o excesso de otimismo que as pessoas impõem a si mesmas no processo de condução de suas vidas. Evitar compulsivamente o contato com emoções negativas, disfarçar o sofrimento, forçar falsos sorrisos, podem ser, a longo prazo, atitudes prejudiciais à saúde mental.

A negação, conforme sustentava Sigmund Freud, é um mecanismo de defesa do ego e está relacionada ao propósito de fuga da realidade. A princípio parece bom, mas a longo prazo é prejudicial à saúde mental causando ansiedade, pânico e depressão. Por outro lado, a aceitação natural dos acontecimentos penosos, vivenciando todas as suas etapas, contribui para a sua superação, além de trazer amadurecimento e equilíbrio à personalidade. Não devemos confundir Positividade Tóxica com o otimismo que algumas pessoas têm. Enfrentar as adversidades com esperança, sem ignorar a realidade é bem diferente da postura do indivíduo com Positividade Tóxica.

A falta de empatia é, também, uma característica marcante da Positividade tóxica; o indivíduo preocupado consigo mesmo, não consegue colocar-se na perspectiva do outro, tornando-se, assim, egoísta. Quando alguém compartilha um sofrimento com um positivista tóxico, é comum ouvir, como resposta, frases evasivas tipo: isso não é nada, você é forte, etc. A tendência de querer positivar também é outra característica marcante do positivista tóxico. Por exemplo, quando alguém reclama do emprego, ouvir de volta algo como pelo menos você tem emprego. Isso promove desconexão além de não validar o sentimento do outro.

A ideia de que o agradável, o prazeroso, o motivador, devem estar acima das outras emoções consideradas negativas, gera egoísmo tanto no aspecto individual como no social. O distanciamento empático não contribui para um ideal de sociedade humana e fraterna, sobretudo nesses tempos difíceis pelo qual o mundo está passando. Desligar o rádio e a TV, fechar os olhos para as tragédias, não melhora o indivíduo e tampouco o mundo em que ele vive. Compartilhar a humanidade é aceitar que a dor do outro é, também, a minha dor. Nesse contexto, somos todos palestinos, judeus, russos e ucranianos, pois somos todos humanos. É melhor abrir os olhos para ver e o coração para sentir, pois o pior sofrimento é aquele em que fingimos estar felizes.

 

Romildo R. Almeida – Psicólogo Clínico